O fenômeno Big Data possui 3 características principais
conhecidas como 3Vs das informações. São elas:
- volume: cada vez mais a Humanidade gera e armazena mais
informações. As tecnologias como rádio, TV e telefone geraram mudanças na
comunicação (velocidade e volume de informações). Mas a Internet aumentou tudo
isto e ainda permite que pessoas gerem informações que ficam disponíveis
publicamente. É a explosão de informações.
- velocidade: hoje em dia é possível escrever um post num blog como este e divulgá-lo
instantaneamente para milhares de pessoas em diferentes partes do mundo.
- variedade: a variedade de informações acontece porque
nosso mundo está se tornando mais complexo. Geramos e armazenamos informações
em formatos diferentes como textos, diagramas, figuras, sons, planilhas,
tabelas, gráficos, etc. Além disto, nossos conceitos estão evoluindo para
estados menos estáveis ou concretos. Por exemplo: como definir hoje em dia uma
família ? E um casamento ? Como armazenar a filiação de uma pessoa ? Seriam 2
ou 3 valores possíveis ? Pode haver uma pessoa só com um pai ou uma mãe ? E
sexo então. Há hospitais que trabalham com 12 diferentes tipos de sexo.
Já escrevi sobre o colapso do consenso, termo cunhado por
Alvin Toffler na década de 1980.
Os 3Vs são consequência de um mundo mais complexo.
A complexidade aumenta na proporção direta a:
- número de elementos ou itens envolvidos;
- diferentes tipos dos elementos;
- número de relações entre os elementos;
- diferentes tipos de relações entre os elementos.
Uma equipe de trabalho com homens e mulheres de diferentes
profissões é mais complexo que um time de futebol masculino. Uma sala de aula
com 20 alunos é menos complexa que uma sala com 40 alunos. Uma rede social que
permite ligar amigos e inimigos é mais complexa que uma rede onde somente
amigos estão relacionados.
O mundo está mais complexo porque:
- há mais pessoas no mundo;
- nossos grupos sociais estão aumentando, passando o limite
de 150 para nossa capacidade intelectual (conforme Robin Dunbar);
- as interações entre as pessoas estão mais diversificadas
usando diferentes mídias, tecnologia e redes sociais.
A quem isto tudo vai impactar ?
Campanhas de marketing precisarão entender os diferentes
segmentos de clientes. Haverá mais microssegmentação. Veja quantas revistas
diferentes existem sobre esportes
O atendimento a clientes deverá ser mais personalizado. Jeff
Bezos da Amazon disse que precisa ter 3 milhões de lojas diferentes se tiver 3
milhões de clientes.
A inovação de produtos e serviços ficará cada vez mais
especializada, para finalidades e públicos específicos.
A diversidade é boa. Ela aumenta a criatividade, amplia
oportunidades de negócios. A padronização não funciona mais. O que se quer hoje
é personalização. Mas a padronização é boa porque facilita nossa vida. Imagina atravessar
ruas numa cidade onde em cada esquina há um tipo diferente de sinaleira ? A diversidade
é boa mas dificulta nosso viver (precisaríamos tomar decisões sobre o que fazer
em cada nova situação). Ou seja, a Humanidade procura padronização. Foi por
isto que inventamos e nos adaptamos bem à agricultura. Para entender a natureza
e poder obter alimento de uma forma mais tranquila e regular.
Mas o Big Data só cresce. Cada vez temos mais sensores
espalhados para monitorar nosso mundo. São sensores de luminosidade para
acender ou pagar lâmpadas nas ruas automaticamente, sensores de temperatura
para acionar condicionadores de ar, sensores de chuva e intensidade solar para
melhor adaptar nossa agricultura. E tudo isto feito com diferentes máquinas
interligadas. É a Internet das Coisas (Internet of Things – IoT).
Para poder entender tantos dados sendo gerados e armazenados
vamos precisar de técnicas de análise de dados mais modernas e eficientes, como
Data Mining e BI. Será necessário dividir uma coleção grande de dados em
amostras menores.
Mas também o mundo novo nos trouxe aumento na complexidade da
análise. As necessidades das pessoas estão mais complexas. Antes uma pessoa
queria saber somente o endereço de um cliente. Depois, passou a querer saber
quem são os clientes com determinado perfil. Hoje, quer saber quais os perfis
de clientes que existem num grupo.
Comportamento complexo emerge de comportamentos simples
Esta excelente reportagem da revista National Geographic
Brasil, explica o que é a Teoria dos Enxames e a Sabedoria Coletiva. Ali há
exemplos de comportamentos simples em animais que geram comportamentos
complexos nos grupos.
Eu mesmo já escrevi um pouco sobre isto em
Com as pessoas também acontece o mesmo. Apesar de cada
indivíduo ser um ser inteligente e com comportamento complexo (veja como as
pessoas tomam decisões complexas aqui http://miningtext.blogspot.com.br/2013/09/como-as-pessoas-tomam-decisoes.html),
há também comportamento de enxame nas multidões de humanos, como por exemplo em
clientes comprando por promoções.
Isto também pode acontecer com o Big Data que a gente coleta
e armazena. Uma forma de entender o caso do Big Data seria procurando por
padrões simples nas partes. Assim, não seria necessário procurar por um
comportamento complexo, mas apenas buscar entender como as partes funcionam. Um
formigueiro ou uma colmeia funcionam bem aos olhos de quem está de fora (como
explicado na reportagem da NatGeo). Mas este comportamento complexo é gerado
por ações simples de cada elemento no enxame. Apesar de haver diferentes
funções, elas não são muitas. Cada indivíduo repete as mesmas funções que seus
colegas de mesma função. Por exemplo, ao limpar um terreno, cada formiga coloca
o item que encontra (ex. pedra, resto de alimento, sujeira), próximo de outro
item similar gerando amontoados (isto é um comportamento simples). Se cada
indivíduo fizer isto, teremos montes de itens classificados (um comportamento
complexo), sem uma autoridade central ou alguém com visão holística.
O comportamento do todo é gerado pelas pequenas ações de
cada indivíduo.
É claro que a complexidade não é a mera soma das partes. Há
uma sinergia entre as partes ou diferentes comportamentos simples. O comportamento
é simples nas unidades mas destas relações emerge um comportamento complexo.
Existe o que se chama auto-organização em sistemas
complexos. Os indivíduos ajustam seu comportamento ao avaliar o comportamento
dos outros indivíduos. Por exemplo, uma formiga pode mudar sua função (de
forrageira para soldado) se entender que há poucos indivíduos na outra função.
O feedback e a adaptação são duas características
importantes em sistemas cibernéticos. Eles estão presentes em seres vivos mas
também estão sendo incorporados em máquinas. Um robô que explora um planeta ou
um satélite no céu não podem esperar alguém reprogramar seu comportamento ou
mesmo vir corrigir um defeito. Eles precisam ser autossuficientes e para isto
devem ser programados para se adaptarem a novos ambientes.
Aí é que o Big Data pode ser muito útil. Quanto mais
informações sobre o ambiente e quanto mais retorno ou reações (feedback) de
nossas ações, melhor podemos nos adaptar. Precisamos acelerar o retorno vindo
de diferentes e várias fontes, para melhorar as nossas decisões. Sobrevive quem
se adapta melhor, já dizia Darwin. Mas nos seres vivos a adaptação ou evolução
pode demorar milhões de anos. Precisamos de adaptação rápida. E o Big Data pode
ajudar. Isto também é chamado de “retorno acelerado” (increasing returns).
A descentralização também pode ajudar. Quanto mais partes
colhendo dados, de mais fontes e mais variadas, melhor o feedback.
Será possível controlar um sistema complexo, por exemplo, de clientes ?
Os sistemas complexos impõem dificuldades para entender
causalidade (quem causa o que). O comportamento final é imprevisível se
analisarmos apenas as partes (o todo não é a mera soma das partes).
Por isto, os sistemas de simulação podem ajudar a entender ou
mesmo gerar um comportamento coletivo com muitas partes ou interações. Podemos
fazer simulação de sistemas complexos com NetLogo (https://ccl.northwestern.edu/netlogo/).
É possível programar o comportamento dos tipos de elementos e então simular o
que aconteceria numa multidão. Podemos variar parâmetros e ver o que acontece
em novas simulações. Os parâmetros podem ser: o número inicial de cada tipo de
elemento, os padrões de comportamento (exemplo: probabilidade com que um
elemento consegue mudar o comportamento de outro, ou o quanto um indivíduo muda
seu comportamento em certas situações), o número de interações entre os
indivíduos (por exemplo, quantos vizinhos ou elementos cada indivíduo
encontra).
Axelrod utilizou simulações computacionais para tentar
entender como a cooperação poderia sobreviver em um mundo egoísta. Biólogos
simulam sistemas predador-presa para entender se haverá ou não extinção de
espécies. Economistas simulam mercados. Analistas de Marketing poderiam simular
como uma campanha viral se espalharia, por exemplo, se houvessem tantos eleitos
influenciando o todo (para entender os eleitos, ver livro “O Ponto da Virada”
de Malcolm Gladwell).
Paco Underhill e sua equipe usam mineração de dados sobre observações
de comportamentos de clientes. Suas descobertas estão documentadas no livro “Why
we buy”. Eles extraem padrão do caos. Em resumo, pode-se entender que clientes se
comportam como gado, inclusive sendo direcionados dentro de lojas. Pessoas são
autônomas mas acabam tendo comportamento similar. E uma multidão ainda pode
engessar o comportamento das pessoas pelo chamado Groupthinking ou
condicionamento de manadas.
Um roteiro para tentar entender clientes pela análise de
complexidade:
1.
Observar o comportamento dos indivíduos;
2.
Identificar ações simples que se repetem (classificar,
reduzir, simplificar);
3.
Simular em computador como o todo irá se comportar com
vários comportamentos simples iguais.
A simulação permite testar ideias mas também a evolução de
sistemas dinâmicos, onde indivíduos podem mudar seu comportamento. As regras
básicas da evolução são: diferenciação e seleção. Indivíduos mudam mas só
sobrevivem certos tipos de comportamentos ou características.
Um sistema vivo não é aquele que está estável ou em
equilíbrio, mas sim estabelecido na instabilidade. Os gases na Terra não estão
estáveis. Sua proporção (por exemplo, 21% de oxigênio) é resultado justamente
da instabilidade, ou seja, das muitas reações que estão acontecendo. É o equilíbrio
na corda bamba. O sistema morre se estabilizar.
O atendimento a clientes deve ser também um sistema vivo. Se
for padronizado, morre. Qual estratégia funciona melhor ? Precisamos testar em
ambientes reais (com clientes reais em necessidades e situações reais). Ou
então simular em computador.
Referências sobre Complexidade:
KELLY, Kevin.
Bootstrapping Complexity. Amazon (e-book Kindle), 2011.
WALDROP, M.
Mitchell. Complexity: The Emerging Science at the Edge of Order and Chaos. Simon
and Schuster, 1993.
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