sábado, 16 de maio de 2015

A História da Inovação no Brasil - parte 1

Para entender como se desenvolveu a inovação no Brasil é preciso estudar um pouco da sua História. Nesta parte I, começaremos falando do Brasil antes de Cabral e seguimos pela chegada dos Europeus e primeiras colonizações, incluindo os ciclos econômicos.
Depois, nas partes seguintes, será necessário estudar o Brasil de Getúlio Vargas e JK, o milagre econômico, a abertura da economia pós-ditadura, as crises monetárias e a inflação, o Plano Real, a reserva de mercado da Informática,
No Brasil mais recente, é necessário falar do custo Brasil, do endividamento do brasileiro, dos (poucos) investimentos na infraestrutura do país, da Ciência e Tecnologia e da desigualdade.
Terminaremos falando de grandes empreendedores brasileiros ou imigrantes que aqui fizeram seu nome.
Por fim, tentaremos entender as razões para nosso atraso.


O Brasil antes de Cabral


No Brasil pré-Cabral, havia uma vasta rede de caminhos e trocas, que se estendia até as estradas do Império Inca (que também eram vastas). Eram comercializados sal extraído do mar, conchas ornamentais, mandioca, feijão, milho, penas de aves grandes para enfeites. Os Incas davam cobre, bronze, prata e ouro.

Nossos indígenas descobriram e desenvolveram a agricultura, domesticando plantas e enriquecendo solo com adubos. Daí tiravam seu sustento e faziam remédios eficazes, além de produzirem outros artefatos (inventaram a rede de dormir).

A vida parecia boa tanto que serviu de inspiração para a Utopia de Thomas Morus. Entretanto, eles não eram sustentáveis nem nobre selvagens, pois faziam queimadas e desmatamentos, matavam bebês deficientes, guerreavam entre si, fazendo alianças com europeus para combater outras tribos.

Os primeiros habitantes do Brasil viviam em constando e violento conflito, inclusive utilizando armas químicas (por exemplo, pimenta na fogueira para fumaça tóxica chegar até inimigos), flechas com venenos e incendiárias e terminando em banquetes antropofágicos.

A antropofagia é diferente do canibalismo. Enquanto neste último caso as pessoas comem carne humana por necessidade, na antropofagia é por tradição. Não pelo gosto da carne, mas pelo ritual, para ganhar a força dos guerreiros derrotados que serão devorados e também para não ter que fazer prisioneiros (para não precisar alimentar, e também porque não havia prisões).

Uma das perguntas que surge é como os indígenas se sujeitaram aos jesuítas e às invasões ? Provavelmente aceitando pequenos presentes. Muitos aceitavam ser escravos para poder viajar até a Europa.

Expedições exploratórias e os primeiros empreendedores 


O período entre o Descobrimento e as primeiras colonizações formais foi marcado pela presença de náufragos, traficantes e degredados.

Traficantes procuravam o famoso pau-brasil, para tingir tecidos na Europa, já que a seda púrpura da China estava difícil de conseguir (uma vez que os turcos tomaram Constantinopla em 1453 e fecharam o comércio entre Europa e Ásia, pelo Mediterrâneo e por terra).

Neste período surgem os primeiros empreendedores. D. Manuel (rei de Portugal) arrenda o Brasil para comerciantes portugueses ricos (entre eles, Fernando de Noronha), os quais financiavam expedições para o Brasil em busca do pau-brasil. Entretanto, isto não era muito rentável, pois a tinta do pau-brasil não era igual à púrpura asiática. Por isto, muitos comerciantes continuaram a ir até Ásia passando pela África. A função dos índios era cortar, preparar e embarcar o pau-brasil nos navios. Também não havia muito interesse no Brasil porque aqui não acharam ouro nem prata. A consequência foi a exterminação do pau-brasil.

Nesta época, surge, segundo Darcy Ribeiro, o Cunhadismo: os estrangeiros casavam com índias e faziam parte da tribo, inclusive participando na tomada de decisões. Começa o criatório de gente (a miscigenação). E nascem os primeiros intérpretes e intermediários.

As Capitanias Hereditárias (1532-1549) são um fracasso. Foram criados engenhos para produção de açúcar (da cana) mas o comércio era somente com Portugal.

O Governo Geral (em 1548, tendo em Salvador a primeira capital do país) tinha como objetivo viabilizar a criação de novos engenhos, a integração dos indígenas com os centros de colonização, o combate do comércio ilegal, construir embarcações, defender os colonos e realizar a busca por metais preciosos. Mas aí começam as invasões holandesas e francesas.

Bandeirantes X Pioneiros


Talvez uma das causas para nossa colonização não ter dado certo é porque só havia extrativismo. Os Bandeirantes entravam e extraiam, mas não ficavam. Os Pioneiros  colonizavam, criando infraestrutura e assumindo o país como sua terra. Esta é a diferença da ocupação do oeste do Brasil em relação ao oeste americano e Austrália. O oeste brasileiro só foi realmente povoado com a criação de Brasília.

Para mais detalhes ver:
MOOG, Clodomir Vianna. Bandeirantes E Pioneiros - Paralelos Entre Duas Culturas. 22a ed. José Olympio, 2011.


Os Principais Ciclos Econômicos


A economia do Brasil começa com a exploração do pau-brasil. Com o auxílio de índios em troca de presentinhos, principalmente os traficantes dominaram este ciclo, levando as toras para fazer tintura para roupas na Europa. Época que não teve muito interesse do governo de Portugal. A exploração era feita por comerciantes portugueses licenciados, como Fernando de Noronha, que bancavam os custos.

Depois veio o ciclo da cana-de-açúcar, onde se destaca a mão de obra de escravos afrodescendentes. A Coroa Portuguesa começa a se interessar pela terra, bem como estrangeiros (principalmente holandeses e franceses). Apesar da extração estrangeira, eles acabaram deixando várias feitorias por aqui, inclusive uma parte da renda pela exploração.

O ciclo do Ouro começa após o declínio da produção açucareira. Aqui começam as Entradas e Bandeiras pelo interior de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, com fins puramente extrativistas (sem deixar infraestrutura, mas apenas devastação, inclusive de índios). A Coroa Portuguesa arrendava a exploração e ficava com parte dos lucros. Este período econômico inclui a extração de outros metais preciosos (prata, cobre, diamante, esmeraldas). Mas o Brasil não era o México e o ciclo foi curto. Mas serviu para aumentar o afluxo de populações vindas Portugal, fortalecendo o comércio interno entre vilas e cidades.

O ciclo do Algodão também foi baseado no trabalho escravo, na grande propriedade  e monocultura.

O ciclo da Pecuária permitiu fornecer couro e carnes para o consumo interno das grandes propriedades, fortalecendo as povoações e o comércio. No Sul, destaca-se o charque (carne seca) gerando riqueza e poder para os estancieiros, origem da Revolução Farroupilha.

O ciclo da Borracha foi caracterizado pela atividade extrativista do látex na Amazônia, alcançado destaque mundial principalmente com a recém criada indústria de automóveis. E mais desenvolvimento urbano, na região norte do país. Mas o ciclo encerrou-se devido à concorrência internacional e a infraestrutura criada criou mato no meio da selva.

O ciclo do Café fortaleceu São Paulo e Rio de Janeiro. Impulsionou o crescimento da malha ferroviária e da industrialização.


A Escravidão


Este foi um período que manchou a nossa História e a da Humanidade. Milhões de afrodescendentes trazidos à força para trabalhar e apanhar.

Segundo Darcy Ribeiro, a proporção de homens para mulheres na importação de escravos foi de quatro para um. Muitas mulheres chegaram sem entrar para as estatísticas, por altos preços, para serem amantes de senhores de engenho e capatazes. A Coroa Portuguesa estipulava um limite para importação de escravos. Mas como a necessidade era muito maior, o tráfico negreiro foi um dos melhores negócios desta época.

Os escravos afrodescendentes começaram trabalhando em engenhos de cana de açúcar e depois na mineração, algodão, tabaco, cacau e café.

Antes dos negros, o trabalho era feito por indígenas, escravos ou assalariados (em troca de pequenos presentes). A força do negro sobre o indígena (aparente vantagem) foi a má sorte do negro. Muitos índios morreram por doenças. Além disto, não eram habituados ao trabalho pesado. Não que fossem preguiçosos, mas estavam acostumados a trabalhar apenas para a sua subsistência e colhendo muita coisa da natureza. Também gastavam muita energia em rituais e celebrações, além das guerras entre tribos. A Coroa Portuguesa também proibiu a escravidão de indígenas, por pressão dos jesuítas. Mas estes mesmos se beneficiavam do trabalho “voluntário” de índios. Ser “bom cristão” significava assumir hábitos de trabalho dos europeus (Fausto, 1996).

O custo para trazer e manter escravos era alto. Segundo Marquese (2006), um escravo africano custava, na segunda metade do século XVI, cerca de três vezes mais que um escravo índio. Mas foi a mão de obra escrava que permitiu ao açúcar brasileiro ser competitivo frente aos concorrentes de outras partes do mundo. Foi o mesmo tipo de competição nas fazendas de algodão do Sul dos EUA versus o trabalho pago do Norte, uma das causas da Guerra de Secessão (onde se destacou Abraham Lincoln).

Os índios pareciam ser melhor organizados para resistência à escravidão, seja pela guerra, fuga ou simplesmente recusando trabalho compulsório. E a vantagem também estava em conhecer melhor o ambiente e numa melhor adaptação (Fausto, 1996).

Segundo Darcy Ribeiro, os povos africanos não eram unidos nem na África. Tinham línguas e culturas diferentes e fazem isto até hoje (criam diferenciação entre as tribos através de especializações de culturas e dialetos).

Conforme Marquese (2006), a resistência negra se deu principalmente através dos Quilombos, onde se concentravam escravos fugidos ou alforriados. Por diversas pressões (governos estrangeiros e intelectuais), o número de alforriados também aumentou. Mestiços ou nascidos aqui conseguiam a liberdade. Mas para continuar a produtividade extrativista, mais escravos eram trazidos. A Guerra dos Palmares ocorreu no maior quilombo, que tinha de 6 a 30 mil habitantes. Após esta guerra, a resistência diminuiu. Começaram as hierarquias sociais entre os afrodescendentes. O libertado ajudava a comandar os escravos. O mestiço, agora um brasileiro, também queria ser senhor.

Os escravos trouxeram sua cultura, incluindo comidas, artes, religiões, línguas, etc. E se mesclaram às demais raças criando o povo brasileiro.

Tabela adaptada de Darcy Ribeiro sobre a população brasileira:


Ano
Brancos
Escravos
Índios “integrados”
Índios isolados
Total
1500
0
0
0
5 milhões
5 milhões
1600
50 mil
30 mil
120 mil
4 milhões
4,2 milhões
1700
150 mil
150 mil
200 mil
2 milhões
2,5 milhões
1800
2 milhões
1,5 milhão
500 mil
1 milhão
5 milhões


Os Imigrantes


A ocupação inicial da América se deu por povos vindos da Ásia pelo Estreito de Bering, há 15 mil anos (Cochran e Harpending, 2009). Após a colonização de portugueses e  invasores estrangeiros, incluindo a miscigenação com escravos afrodescendentes, dá-se início à imigração de alemães em 1824 e de italianos em 1875. Espanhóis e japoneses chegam para as fazendas de café em São Paulo no final do século XIX.

Conforme o artigo da Superinteressante, a 2a Guerra Mundial não trouxe tantos imigrantes assim como se pensa.

Nas décadas de 50 e 60, o Brasil atrais estrangeiros porque era o país do futuro (os 50 anos em 5 de JK). A partir de 1980, com inflação alta, muitos estrangeiros saem do Brasil.

Por que os imigrantes vieram ? No século XIX, o Brasil era visto na Europa e na Ásia como um país de muitas oportunidades. Pessoas em países com dificuldades econômicas tinham melhores chances de prosperidade no Brasil. Após a abolição da escravatura no Brasil, muitos fazendeiros contratavam imigrantes para não pagar salários aos ex-escravos. Por isto, nesta época, o governo brasileiro fez campanhas para atrair imigrantes europeus para o Brasil. Muitos imigrantes também vieram fugindo das duas grandes guerras mundiais que atingiram o continente europeu.

A contribuição dos imigrantes nem precisa ser discutida aqui, pois é vista em cada canto deste país.

O imigrante era um inovador e empreendedor por natureza. Quando aqui chegou, só tinha a terra e a força de seu corpo. Teve que produzir sua comida, levantar sua casa, construir moinhos de água. Aos poucos evoluiu para comércio e outros pequenos negócios.

Podemos notar bem a diferença entre localidades povoadas por portugueses versus as povoadas por  imigrantes olhando a diferença de economias e cultura no estado do Rio Grande do Sul. Enquanto o Sul do estado, colonizado por portugueses e seus descendentes, vive basicamente da agricultura e pecuária, o Norte, colonizado por imigrantes principalmente italianos e alemães, concentra a maior parte das indústrias e culturas intensivas. O Sul é formado por poucos municípios com tamanhos grandes. O Norte, por muitos municípios pequenos. O mesmo acontece com as propriedades: no Sul, grandes fazendas e no Norte pequenas propriedades. Enquanto a cultura no Sul é produzir com base na natureza, o Norte cria pequenas indústrias e empresas. A cidade de Pelotas já foi a cidade com maior nível de poupança. Lá os investimentos pessoais vão para imóveis, carros e aplicações financeiras. No Norte, quando sobra alguma grana, as pessoas investem em criar ou ampliar sua pequena empresa.  Esta diferença pode estar na herança dos primeiros habitantes: a cultura portuguesa de aqui chegar, semear e colher, colocar bois nas pastagens e esperar engordar (e o trabalho forçado era feito por escravos) versus o pioneirismo dos imigrantes que não tinham nada além da terra e deviam criar todo o resto.

Referências Bibliográficas


BUENO, Eduardo. Náufragos, traficantes e degredados: as primeiras expedições ao Brasil: 1500-1531. Volume II. Objetiva, 2006.

COCHRAN, Gregory & HARPENDING, Henry. The 10,000 year explosion: how civilization accelerated human evolution. NY: Basic Books, 2009.

FAUSTO, Boris. História do Brasil - cobre um período de mais de quinhentos anos, desde as raízes da colonização portuguesa até nossos dias. EDUSP, 1996.

MARQUESE, Rafael de Bivar. A Dinâmica da Escravidão no Brsail - resistência, tráfico negreiro e alforrias, séculos XVII a XIX. Novos Estudos, v. 74, Março de 2006,
p.107-123.

PEIXOTO, Afrânio. História do Brasil. Cia. Editora Nacional, 2008.

RIBEIRO, Darcy. A História do Povo Brasileiro - a formação e o sentido do Brasil. 2a.ed. Companhia das Letras, 1995.


URBIM, Emiliano. 1499 - o Brasil antes de Cabral. Revista Superinteressante, ed. 329, Fevereiro de 2014.

sábado, 9 de maio de 2015

De onde vem o Conhecimento, Inteligência, Criatividade e Descobertas: análise dos processos cognitivos

O objetivo deste texto não é explorar questões biológicas ou neurológicas sobre o funcionamento do cérebro para que possamos criar algo novo ou resolver problemas. A ideia é tentar categorizar os processos cognitivos que podem levar ao conhecimento novo, às descobertas, a soluções de problemas e aumento da inteligência.

Apesar de alguns autores acreditarem que descobertas, invenções e soluções podem surgir por acaso (por serendipity), minha percepção é diferente. É falso acreditar que Arquimedes resolveu o problema do Rei sem nada saber. Antes, ele estudou muito o problema e possíveis soluções. Mesmo aqueles que sonharam com soluções é porque estavam, durante o dia, colhendo informações. Talvez o momento Eurekha tenha sido a junção das peças do quebra-cabeça (como Koestler e Johnson dizem ser um dos passos essenciais para a criatividade). Mas então antes era preciso colher e analisar as peças.

Da mesma forma, Kekulé sonhou com uma estrutura química a partir de conhecimentos que já tinha. Newton não descobriu a Teoria da Gravidade apenas olhando uma maçã cair. Este foi o evento que talvez tenha representado melhor o problema para ele. Mas seus anos de estudos anteriores foram imprescindíveis. E Pasteur só descobriu a penicilina porque teve curiosidade e observou o que tinha acontecido na sua lâmina de ensaios durante sua ausência.

Muitos casos tidos como descobertas ao acaso são relatados no livro de Royson Roberts (Serendipity). Mas certamente cada caso pode encaixar-se em pelo menos um dos processos mentais categorizados neste texto.

A sorte favorece a mente preparada (frase associada a Pasteur por vários autores). Isto quer dizer que, para descobrir algo por acaso, é preciso ter informações, hipóteses, testes, ideias, etc. É preciso testar, experimentar, observar, perguntar, etc. 

Na sequência deste texto, eu tento categorizar os diferentes processos cognitivos que podem nos ajudar na busca por soluções, conhecimento, descobertas e invenções.

Provavelmente uma postagem futura tratará de processos biológicos e neurológicos. Aí poderemos falar de como o café e o cochilo ajudam a criatividade, como funcionam os 2 hemisférios cerebrais, de onde exatamente no nosso corpo vêm as boas ideias. E também há espaço para falar da importância da colaboração e das redes sociais. Os livros de Alex Pentland (Social Physics), Koestler (O Ato da Criação) e Johnson (De onde vêm as boas ideias) são referências básicas neste assunto.



Tentativa e erro

Uma das primeiras formas de resolver problemas foi a tentativa e erro, já utilizada por nossos antepassados do gênero Homo e por outros animais. Pegar uma pedra para quebrar algo e se não der certo procurar outra maior, parecem ser atitudes instintivas.
O interessante deste processo mental é que ele gera memória. Uma memória associativa (lembrar da pedra quando vir o mesmo objeto ou objetivo) e uma memória de recompensa ou erro (se deu certo ou não), o que irá influenciar o comportamento futuro, gerando conhecimento novo. 
O problema da tentativa e erro é o desgaste. Um projeto de solução poderia avaliar os resultados prováveis e nos levar às alternativas mais promissoras.


Instintos

Os instintos são reflexos de nossos genes e alguns estão enraizados em nós desde o tempo das savanas (antes das cavernas), sendo transmitidos de geração em geração por milhares de anos. Winston (2006) discute diversos tipos de instintos, desde os envolvidos com acasalamento e reprodução, até o medo, a fome, a agressividade e raiva, a necessidade de sobrevivência e o egoísmo e cooperação.

Instintos envolvem reações químicas que avisam o cérebro sobre acontecimentos. E o cérebro repassa a informação para outros órgãos. Isto é fruto da seleção natural, por milhões de anos aprimorando os seres para adaptação ao meio em que vivem. Por exemplo, uma criança (ou qualquer outro animal) ter medo de cobra e não ter medo de uma flor, sem ter visto antes uma cobra ou uma flor; isto acontece sem que haja experiências anteriores. É instinto e está registrado em nossos genes.

Conforme Dawkins (2007) e Winston (2006) muito do nosso comportamento é moldado por genes. A escolha de um parceiro sexual é influenciada pelos instintos. Recebemos dados do parceiro (cheiro, timbre de voz, aparência) e isto desencadeia reações internas no corpo, as quais nos predispõem para algumas escolhas. Nenês choram quando estão com fome, sem precisar se dar conta que estão com fome. Os instintos nos ajudam a tomar decisões rápidas, quando não há tempo para pensar. O medo para fugir, o instinto de pegar algo que está caindo, a fuga do fogo, o agradecimento com um sorriso.

Entretanto, os genes não dizem o que devemos fazer numa determinada situação, apenas nos dão predisposição para aprendermos e adaptarmo-nos a novas situações, influenciando assim nossas decisões. Mas sempre há escolhas que podem ser feitas com base em crenças e princípios, ou mesmo através da lógica, contrariando os instintos.

Apesar da grande influência dos nossos genes, também aprendemos com a cultura e experiência, e somos influenciados pelo meio em que crescemos e vivemos. O sorriso pode sair de forma espontânea, mas também podemos treiná-lo para sermos cordiais e certamente isto é aprendido na família. Segundo Dawkins, nossos genes poderão nos instruir a ser egoístas, mas não estamos necessariamente compelidos a obedecê-los por toda nossa vida. Somos produtos dos genes e do meio em que vivemos. Uma combinação de ambos. Ora nos comportamos como homens e mulheres das cavernas, ora como “pessoas civilizadas”. David Shenk no livro "O Gênio em todos nós" explica melhor a combinação de genes e cultura (nature X nurture).

O uso dos instintos é ainda um processo mental pouco conhecido e muito dependente da nossa estrutura biológica e neurológica. Por esta, razão não vamos aprofundá-lo aqui neste texto. Talvez seja uma combinação da tentativa e erro com a memória.


Imitação, cópia e observação

Provavelmente os homens primitivos começaram a comer carne (o que permitiu o aumento do cérebro e da inteligência) vendo outros animais (predadores e aqueles posicionados mais no topo da cadeia alimentar) fazendo o mesmo. E os imitou.

A imitação ou cópia precisa de outro processo mental que é a observação, seja do ambiente, de objetos ou do que outros indivíduos estão fazendo.

A imitação ou cópia gera novo conhecimento porque começamos a repetir algo sem mesmo saber se é bom, se vai dar certo. É um processo que se combina com a memória e a experimentação e prototipação, como discutiremos adiante.

Newton e Galileu fizeram da observação um dos seus meios principais de entendimento do universo e suas leis.

Malcolm Gladwell, no livro "O Ponto da Virada", fala sobre o poder da imitação na disseminação de conhecimento, hábitos e influência das pessoas.


Memória


A memória basicamente é um mecanismo de recuperação de informações que nos permite repetir coisas que deram certo ou evitar coisas que deram errado. Por si só, ela já é composta de conhecimento. Mas a forma como a usamos para criar soluções ou inventar coisas ainda é pouco entendida.

Segundo Ivan Izquierdo, as memórias não são gravadas na sua forma definitiva e são muito mais sensíveis à facilitação ou inibição logo após sua aquisição, funcionando como um filtro do que será armazenado. São também sensíveis à incorporação de informação adicional nos primeiros minutos ou horas após a aquisição. Essa informação pode ser acrescentada, tanto por substâncias endógenas liberadas pela própria experiência (b-endorfina, adrenalina, etc.), como por outras experiências que deixam memórias. Por isto que as memórias adquiridas em estado de alerta e com certa carga emocional ou afetiva são melhor lembradas que as memórias de fatos inexpressivos ou adquiridas em estado de sonolência. Mas um cochilo ajuda a memorizar, segundo Gais et al. (2006).

Segundo Gais et al. ainda, a recuperação da memória é desencadeada por algum estímulo semelhante àqueles inerentes a cada experiência. Algumas memórias requerem muitos estímulos para serem lembradas: é o caso das memórias de atos-motores elaborados ou complexos, ou de procedimentos com muitas regras

Conforme Zacks, organizamos a atividade mental em uma hierarquia de eventos, colocamos fronteiras para dividir e entender partes, pois isto nos ajuda a memorizar e aprender, entender o contexto e a sequência, a lidar com interrupções.

Segundo Izquierdo, temos os seguintes tipos de memórias:
      Memória sensorial:  é a informação de entrada, recebida do meio-ambiente pelos sentidos;
      Memória Rápida ou de Curto Termo: dura entre 10 segundos e 6 horas; é onde são depositadas informações recebidas da entrada ou que irá para a saída; a quantidade de "nacos" (chunks) de informações armazenada é de 7 ± 2, ou seja, ao se captar um certo número de informações por um dos sentidos de entrada, a memória de curto termo guarda em média 7 destas informações com uma variação média de 2, ou seja, entre 5 e 9 (conforme George Miller, 1956).
      Memória de Trabalho ou Temporária: é o “meio de campo” entre memória rápida e permanente; organiza os dados recebidos, filtra e manda para a permanente, recupera da permanente para a rápida e faz associações;
      Memória Permanente ou de Longo Termo: é a que fica o tempo mas é limitada e por isto substitui as antigas pelas novas.

Segundo Pentland, o limite do nosso cérebro e portanto da nossa inteligência está no consumo de energia. Não conseguimos produzir mais energia para o cérebro. Isto porque (conforme Winston) nosso cérebro tem 2% do tamanho do corpo mas consome 20% da energia.A ideia de Pentland é suprir esta energia com fontes externas ao corpo.
Conforme Stern (2014), aí vão algumas dicas para memorizar melhor:

1) cada vez que você recupera uma memória, o cérebro altera a memória integrando novas informações, talvez incluindo seu estado de humor no momento;

2) o momento da recuperação pode deturpar a memória e alterar o evento que estamos recordando;

3) neurocientistas conseguiram alterar a memória de ratos. No caso, o experimento era lembrar qual cômodo era seguro;

4) experimentos com ratos provaram que é possível herdar memória de nossos pais e talvez até de nosso avós;

5) cafeína pode ajudar na recuperação de memória recente, mas só funciona com quem não bebe cafeína regularmente.

E também: procure colocar os itens a serem memorizados num contexto. Por exemplo, pode-se contar uma história para facilitar as associações e depois a recuperação.

Eu disse que não ia falar em processos biológicos ou neurológicos, mas acabei tocando no assunto.


Experimentação e encenação


Consiste em repetir gestos, movimentos ou então criar protótipos de objetos ou soluções.

Ajuda porque permite recriar um ambiente ou situação e pensar nos detalhes do problema existente ou na solução provável.

A experimentação pode ser estimulada pela leitura ou por outros sentidos. Ao ler, estimulamos as mesmas áreas cerebrais como se estivéssemos tendo a experiência (conforme Speer e outros).

É por isto que muito se fala hoje em dia de "storytelling". Esta é uma forma bastante eficiente de construir conhecimento em outra pessoa. Uma pessoa toma como verdade o que os outros dizem. A tradição de passar conhecimento via oral é anterior à escrita mas continua hoje em dia, através de livros e filmes. Agora com a tecnologia, o meio de transmissão incorpora elementos como Internet e redes sociais.



Representação Simbólica


Esta representação é feita através de signos, que podem ser desenhos ou textos. Funciona como uma memória auxiliar e começou há no mínimo 50 mil anos atrás, quando os homens primitivos começaram a fazer riscos nas pedras, madeiras, ossos e paredes. Depois evoluiu para desenhos mais refinados e esculturas. Mas antes disto já havia colares de conchas, o que de certa forma também são representações simbólicas.

O simbolismo não leva diretamente a novo conhecimento (precisa ser manipulado) mas ajuda em outros processos cognitivos, como por exemplo o raciocínio lógico e a memorização.


Sentidos, experiência e observação do meio - Empirismo

O homem descobriu que o fogo queima experimentando e não porque ouviu alguém falar sobre isto ou porque observou alguém se queimando. Apesar de que hoje em dia, este já virou um conhecimento de senso comum e ninguém precisa colocar o dedo na chama para saber o que acontece.

Os defensores do Empirismo, como Francis Bacon e David Hume , acreditavam que a origem do conhecimento vem da experiência dos sentidos (visão, audição, tato, olfato, paladar) e somente desta.

John Locke formula a teoria da "tábua rasa", afirmando que todas as pessoas nascem sem conhecimento algum (i.e. a mente é, inicialmente, como uma "folha em branco"), e todo o processo do conhecer, do saber e do agir é aprendido através da experiência.



Lógica e raciocínio - Racionalismo

Contrapondo o Empirismo, os defensores do Racionalismo acreditam que a origem do conhecimento se encontra na razão, tido como o único e exclusivo instrumento capaz de conhecer verdades universais. Entre os principais defensores está René Descartes (1596-1650), autor da famosa frase: “Penso, logo existo.”


A Indução funciona assim: partindo das observações, criamos teorias (princípios explanatórios).
Já a Dedução parte da teoria ou regras para gerar novos conhecimentos.

Exemplo: se observarmos que
A1 é P
A2 é P
A3 é P
Podemos induzir uma regra tal que "Todos A´s são P".

Por exemplo: se virmos uma ave voando, depois outra, mais outra e assim por diante, podemos chegar na regra "toda ave voa".

O problema está na confirmação da hipótese. E o próximo A ? A próxima ave que encontrarmos também voará ? Pode haver exceções como o pinguim.

Em geral, este tipo de descoberta acontece com amostras dos dados. Então, devemos extrapolar as amostras, tentando observar a regra em toda a base ou em amostras maiores ou em outras amostras.

Por exemplo, uma fabricante de cosméticos descobriu, numa amostra de vendas feitas no último mês, que 70% das mulheres estavam comprando os produtos X e Y juntos. Está é a indução. Agora eles devem fazer a dedução, ou seja, a observação de novos casos, por exemplo, nos meses seguintes. Isto poderá confirmar a hipótese ou mostrar que era apenas um evento passageiro, relativo somente àquele período. A confirmação da hipótese pode ser feito encontrando uma relação estatística entre X e Y.


A Dedução pode utilizar dois modos:

P è Q
P sendo verdadeiro, Q também será
(podemos deduzir Q de P e da regra)

Ex.: Para todo peixe, Se é peixe Então vive na água.
Se XYZ é peixe, então XYZ vive na água.

P è Q
se Q é falso (não Q)
Então P também é falso

Ex.: Para todo peixe, Se é peixe Então voa.
Se XYZ não vive na água, então XYZ não é peixe.


Método Cartesiano - o método de René Descartes

Passos ou preceitos:
1.      Nunca aceitar algo como verdadeiro sem conhecer; receber as informações com ceticismo, examinando sua racionalidade e sua justificação. Verificar a verdade, a boa procedência daquilo que se investiga – aceitar o que seja indubitável, apenas.
2.      Análise, ou divisão do assunto em tantas partes quanto possível e necessário; dividir cada uma das dificuldades em tantas partes quanto for possível e necessário para melhor entendê-las e resolvê-las;
3.      Síntese, ou elaboração progressiva de conclusões abrangentes e ordenadas a partir de objetos mais simples e fáceis até os mais complexos e difíceis.
4.      Enumerar e revisar minuciosamente as conclusões, garantindo que nada seja omitido e que a coerência geral exista.

Exemplo:
Uma empresa está enfrentando furtos em seu armazém.
A análise consiste em identificar as partes envolvidas. Neste caso, a situação envolve não só funcionários mas também pessoas de fora da empresa, que podem estar entrando sem autorização sem ninguém. Mas também há funcionários de fornecedores que eventualmente e por curto tempo entram na empresa (por exemplo, para usar o banheiro). Este conjunto de elementos, é claro, está relacionado a um conjunto de hipóteses que levam a uma pessoa causadora dos furtos. Mas talvez a empresa tenha que também pensar em hipóteses diferentes. Por exemplo, mercadorias mal armazenadas, que se perdem dentro do armazém. Ou então erros humanos de processo, fazendo com que mercadorias sejam devolvidas aos fornecedores.
A síntese consiste em elaborar hipóteses (quem está furtando, como e por que). Cada hipótese também será decomposta. Por exemplo, pode-se formular hipóteses sobre a forma do ato, ou seja, com o processo acontece (as etapas). Para tanto, pode-se usar o chamado senso comum, ou seja, aquilo que é normalmente conhecido ou já sabido pela maioria das pessoas. São conhecimentos



Newton usou este método para descobrir decomposição da luz

Por exemplo, ao encontrar o problema de transpor um rio, podemos usar:
- Análise: pensar que uma ponte resolver o problema e regredir na hierarquia de elementos para ir construindo cada nível;
- Síntese: a partir dos elementos disponíveis ou básicos, como chegar a uma solução final (jogo de xadrez também é assim).


Passos:
1. Observação do fenômeno;
2. Resolução da complexidade: entender elementos, relações, quantidades;
3. Hipótese explicativa;
4. Verificação da hipótese (experimentação);

Exemplo:
O fenômeno observado é que há produtos com estoque acima de 20% do estoque mínimo.
Resolver a complexidade seria analisar os componentes sistêmicos desta situação, ou seja, o que está envolvido no caso. Com isto, a empresa descobre quem são os compradores que estão tomando as decisões, de que fornecedores estão sendo comprados estes produtos, quando compram (ritmo ou irregularidade), onde estão sendo estocados e vendidos os produtos. A questão de identificar os elementos envolvidos nem sempre é tão trivial. Em capítulo adiante, discutiremos estas questões.
Pode-se usar um grafo para representar as relações entre estes elementos. Por exemplo, quem compra de quais fornecedores (pode haver preferências), para quais lojas ou armazéns (pode haver um padrão, mesmo que aleatório, sem intenção consciente das pessoas).



Segundo Hempel (apud Thomas Kuhn) há 3 fases na avaliação de hipóteses científicas:
1.      acumular observações, descrevendo status das observações ou experimentos;
2.      verificar se estas observações confirmam, contradizem ou são neutras em relação às hipóteses;
3.      decidir aceitar, rejeitar ou suspender julgamento das hipóteses.

Para confirmar a teoria, é preciso gerar novas observações e verificar se são verdadeiras. Um caso contrário contradiz a teoria e aí é preciso refiná-la ou rejeitar toda a teoria.

Karl Popper afirma que não há como testar todas as hipóteses possíveis. E mesmo um número pequeno de hipóteses talvez não valha a pena ou o custo de serem testadas. Então costuma-se usar o que é mais provável até uma nova quebra de paradigma.

Em relação às teorias imprecisas, o que fazemos em cada momento da História é seguir pelas hipóteses mais prováveis. Pode acontecer de não termos conhecimento suficiente ainda para determinar novas teorias. Foi o que aconteceu com Ptolomeu, Copérnico, depois Newton, até a chegada de Einstein. As teorias anteriores conseguiam descrever parte dos fenômenos, mas não eram completas. Algumas exceções eram aceitas e a própria imperfeição da teoria também. Isto em razão de não haver uma teoria mais completa e perfeita (ver o livro de Thomas Kuhn).

A questão é que há muito conhecimento que não é determinístico, ou seja, acontece em muitos casos (talvez a maioria) mas não em todos. Para tanto, devemos usar conhecimento probabilístico e aceitar teorias com um certo nível de confiança. Por exemplo, descobrir que 70% dos clientes que compraram o produto X pagaram em 10 parcelas não se refere a todos os casos, mas pode ser útil para a tomada de decisão.



Para uma asserção ser refutável ou falseável, em princípio será possível fazer uma observação ou fazer uma experiência física que tente mostrar que essa asserção é falsa.
Por exemplo, a asserção "todos os corvos são pretos" poderia ser falseada pela observação de um corvo vermelho. A escola de pensamento que coloca a ênfase na importância da falseabilidade como um princípio filosófico é conhecida como a Falseabilidade.

Ex.: como provar que horóscopo não funciona ?
Se não existir um procedimento que permita provar isto, não é uma "boa" teoria.
Se tiver como provar, e não se conseguir provar, a teoria está correta.

Falsas teorias podem explicar praticamente tudo em seus respectivos campos.
Ex.: a teoria marxista da história, a psicanálise, a psicologia individual, astrologia.


Aristóteles considerava Zenão de Eleia o fundador da dialética. Outros consideraram Sócrates. Para Platão a dialética é o único caminho que leva ao verdadeiro conhecimento. Pois a partir do método dialético de perguntas e respostas é possível iniciar o processo de busca da verdade. Em sua Alegoria da Caverna, Platão fala da existência de dois mundos: o mundo sensível e o mundo das ideias. Sendo o segundo alcançado apenas através da dialética, da investigação de conceitos.

Segundo Hegel, primeiro existe a TESE, que é a ideia, gerando uma ANTÍTESE, que se contrapõe à TESE, surgindo assim a SÍNTESE, que é a superação das anteriores.



Se contrapõe ao método cartesiano de Descartes

Segundo Charles Sanders Peirce (1975): “a abdução é o processo para formar hipóteses explicativas. A dedução prova algo que deve ser, a indução mostra algo que atualmente é operatório, já a abdução faz uma mera sugestão de algo que pode ser.  Para apreender ou compreender os fenômenos, só a abdução pode funcionar como método. O raciocínio abdutivo são as hipóteses que formulamos antes da confirmação (ou negação) do caso”. 

A Dedução funciona assim:
Tendo a regra A ==> B (A implica em B), se A é verdadeiro, então deduzimos B.

A Indução por sua vez é assim:
Tendo várias instâncias de A e B, induzimos a regra A ==> B (se A, então B)

Já a Abdução é assim:
Tendo a regra A ==> B (se A, então B), Se B é um fato comprovado, podemos abduzir (como hipótese) que A é verdadeiro e sua causa.
Que premissa está faltando para conclusão ser verdadeira e o argumento (implicação entre premissas e conclusão) ser válido ? Devemos procurar pelas premissas.


Refinamento de ideias


Reframe é repensar o problema com outros esquemas, pontos de vista, elementos, dados, contextos, regras, etc. Talvez o momento Eureka dependa de vermos o problema com outros olhos, sem mesmo precisar mudar as informações ou o contexto. Basta "pensar diferente".

Não se pode simplesmente ficar em cima de um problema usando os mesmos paradigmas; o resultado será sempre o mesmo. Repensar tem que ser "reformular". Por isto que quando temos um problema devemos sair do ambiente, fazer outra coisa (ex. Arquimedes). Muitas vezes fazemos isto e quando voltamos "enxergamos" a solução de primeira e pensamos: "por que não vi isto antes ?"

Para reformular, temos que nos libertar das regras que estamos usando. Einstein, Galileu  e Darwin quebraram paradigmas. Mas para isto, precisaram se libertar das teorias aceitas em suas épocas. Se pensarmos que um problema só tem uma solução possível (ou caminho para a solução), a tendência é tentar colocar os dados num esquema que leve por este caminho. É por isto que muitas soluções aparecem em sonhos, porque quando dormimos a parte do cérebro que dita regras e conexões lógicas está dormindo também. Por isto é que sonhamos coisas estranhas, sem lógica. Mas é também o que permite conectar diferentes matrizes e fazer associações novas (que acordados não fazemos).

Uma sugestão é utilizar esquemas diferentes para representação ou descrição do problema. Podemos usar diagramas (esquemas visuais), textos, imagens em sequência (storytelling), planilhas e até mesmo gravações de áudio (segundo a Neurolinguística, algumas pessoas retém melhor as informações ouvindo, outras vendo, outras tocando, etc.).

Precisamos voltar, tomar direções diferentes, usar dados diferentes, observar detalhes que talvez não fossem considerados tão importantes, refazer as perguntas. Sair das regras normais e hábitos, ver o que está escondido (hidden analogies). É justamente o contrário de usar analogias e benchmarking.

Recentemente, surgiu uma explicação possível para as pedras (algumas com mais de 300 quilos) que se movem sozinhas no lago seco de Racetrack Playa, no deserto de Mojave nos EUA. Elas deslizam pelo solo deixando marcas bem visíveis atrás delas. O geólogo da NASA Ralph Lorenz acredita que as rochas são movidas pela ação dos ventos e da água. Ele acredita que elas ficam envoltas em gelo durante o inverno, então quando o leito do lago derrete e fica lamacento, o gelo permite às pedras deslizar sobre o barro, impulsionadas pelos ventos fortes do deserto.

Combinação de ideias ou recursos

Criar algo novo combinando o que já existe. Ver o post anterior (Como melhorar o fluxo de ideias).

Identificação de padrões que se repetem

Se o mundo e nossa vida não tivessem padrões, se não houvesse repetições, como seria viver ? Acordar de manhã e não saber se vai escurecer ou clarear. Levantar e não saber se devemos comer ou sair. Chegar na rua e não saber o que significa o sinal vermelho. Não saber nem mesmo onde procurar alimento. Tudo seria novidade.

A identificação de padrões é parte da nossa vida. A descoberta de padrões iniciou há milhares de anos atrás. Nossos antepassados conseguiam prever as variações do tempo, as estações, os ciclos das plantações, as fases lunar e eclipses, e até mesmo o surgimento de reis. E hoje em dia não é diferente. Quem não dá palpites sobre como será o tempo, se vai chover, fazer sol, calor, observando as nuvens ? Ou se o próximo inverno será mais frio ou menos frio do que o ano anterior, pelo que viu no outono ? Se um local público vai lotar ou não para um evento, observando o movimento das pessoas chegando ? Ou quantas pessoas há num concerto ao ar livre num parque público, lembrando o último evento que ocorreu ali ? Mesmo algumas superstições são exemplos de padrões, que acreditamos que irão se repetir. Numa entrevista de negócios, usar a mesma roupa de um acontecimento bom. Sentar no mesmo lugar do último título para torcer por seu time. Não quebrar espelho, pois quando isto ocorreu, um evento de má sorte também ocorreu junto.

Vemos padrões no ambiente, no que vemos e sentimos e daí criamos modelos para o clima, trânsito, estereótipos de pessoas, etc. Alguns modelos mais completos que outros, alguns mais precisos, outros com mais exceções. Vemos até mesmo padrões na nossa própria vida. Wolf (2010) relata uma série de casos de pessoas analisando seus próprios dados. Como o cara que descobriu estatisticamente que café não ajudava na concentração dele (ele acreditava no contrário, mas fez experimentos e descobriu um novo padrão, mais exato).

A classificação é um instinto do ser humano. Tentamos colocar tudo em grupos (pessoas, produtos, eventos, animais, plantas, etc.). Mesmo num texto como este, as informações estão agrupadas. Acreditamos que podemos reduzir tudo a um modelo único ou a poucas regras. Esta é a busca eterna dos físicos, para entender a Natureza e o Universo. Einstein acreditava que há uma ordem na desordem, mas que os padrões ainda devem ser descobertos. 

A classificação facilita nosso entendimento do mundo e agiliza nossa tomada de decisão. Os padrões servem para minimizar a incerteza. Se encontramos uma situação nova e verificamos que ela se encaixa num padrão já entendido, já sabemos que atitudes tomar naquela situação. Este é um dos conceitos de inteligência: saber adaptar-se a novas situações e conseguir resolver problemas novos. Isto não significa que vamos usar exatamente as mesmas ações. A inteligência humana pressupõe a adaptação dos padrões para novas realidades.

A melhor forma de entender um conjunto de dados é estabelecer um modelo para ele. O modelo explicaria as características comuns aos dados, as relações entre os dados, as relações de causalidade e influência ao longo do tempo. O ser humano busca padrões no seu contexto porque se sentirá mais parte do contexto e menos um alienígena. É como uma necessidade humana, para não ficarmos loucos. O que não se encaixa nos nossos padrões, como por exemplo eventos paranormais, acabamos considerando como bruxarias.

Para mais sobre este assunto, ver a parte introdutória do meu livro sobre BI (pode baixar grátis aqui).

Ideias vindas de sonhos


Kekulé sonhou com um cobra mordendo o seu próprio rabo (da cobra) e descobriu a molécula do Benzeno. Paul McCartney sonhou com a melodia de Yesterday (veja o filme “A Origem / The insertion ” com Leonardo de Caprio). Sim os sonhos podem nos ajudar a resolver problemas ou encontrar soluções criativas.

A Revista INFO de Janeiro de 2012 fez uma brilhante reportagem sobre a importância   dos sonhos para encontrar respostas para problemas, curar depressão, superar pesadelos, criatividade, etc.

Segundo esta reportagem, na parte de sono profundo, a área frontal do cérebro realiza menos atividades. Justamente a área que é responsável pela razão e julgamento. Isto gera menos censura e rigidez de pensamento, bem como não nos limita às regras e normas do cotidiano. É por isto que sonhamos "coisas loucas" que por exemplo extrapolam leis da Física.

Mas seria possível direcionar ou controlar os sonhos para nos ajudar a resolver problemas. Este artigo da Scientific Amercian diz que sim.

A reportagem da Revista Info sugere alguma técnicas, que devem ser utilizadas antes de dormir:
      Pensar na situação antes de deitar (imagens podem ajudar);
      Na cama, tentar visualizar o problema como um objeto;
      Pensar que vai sonhar com a solução;
      Quando acordar, tente lembrar do que sonhou;
      Papel e caneta ao lado da cama ajudam a anotar soluções durante a noite.


Imaginação - os visionários

A imaginação não tem limite e por isto pode ser uma boa fonte de conhecimento para solucionar problemas ou criar algo novo. Ela consiste em pensar ou ver o que não existe ainda.

Júlio Verne é um dos autores mais criativos até hoje lembrado. Ele imaginou o Submarino (no livro “20.000 léguas submarinas”). Previu em 1863 que Paris (em 1960) teria ar condicionado, TV, elevadores, trens, automóveis a gasolina, máquinas de fax e algo parecido com Internet (livro "Paris no Século XX"). Em 1865, no livro "Da Terra à Lua" (“From the Earth to the Moon”), previu detalhes da missão para a Lua (tamanho da cápsula, local do lançamento perto do Cabo Canaveral, número de astronautas, tempo total da viagem, perda de peso na lua, e a volta caindo no oceano). Além de ter sido pioneiro em invenções como energia nuclear, arma elétrica. Ele também usava outros processos cognitivos tais como imitação e combinação, pois frequentava feiras de ciência e inovação para ter ideias (o submarino, por exemplo, foi visualizado como um veículo que voava com hélices).

Isaac Asimov imaginou um mundo com robôs inteligentes e daí os problemas sociais decorrentes da mistura pessoas + máquinas. H.G.Wells escreveu livros de ficção científica famosos como guerra dos mundos (1898), máquina do tempo (1895), homem invisível (1897).

Philip K. Dick também tem uma vasta lista de livros famosos que influenciaram filmes como Blade Runner - O Caçador de Andróides; Total Recall (O Vingador do Futuro);  Minority Report - A Nova Lei; O Vidente (com Nicholas Cage); Agentes do Destino, O Pagamento).

Também não posso deixar de citar outros autores de ficção que influenciam até hoje inovações, tais como Arthur C. Clarke (2001 uma odisséia no espaço; 2010 o ano em que faremos contato); Mary Shelley (Frankenstein); Aldous Huxley (Admirável mundo novo); Eugene Wesley Roddenberry (Série Star Trek).

E há os cientistas visionários que usaram a imaginação mais que o conhecimento, tais como Leonardo Da Vinci, Benjamin Franklin, Thomas Alva Edison, Nikola Tesla,
Santos Dumont e Isaac Newton.


Fazer as perguntas certas, procurar causas

O que diferenciou Darwin de outros pesquisadores que acreditavam e estudavam a teoria da evolução foi que conseguiu provar a teoria com o seu porquê e como. Mas para isto, ele precisou fazer as perguntas certas. Neste caso, por que as espécies evoluíam e como (origem das modificações e como passavam entre as gerações).

O começo é sempre com hipóteses. Segundo Darwin, "ninguém pode ser bom observador se não tiver uma teoria antes". É preciso direcionar o foco da observação, porque pode haver muita informação.

Isto não significa apaixonar-se pela teoria e não enxergar outros caminhos. Darwin mesmo tinha algumas teorias iniciais (vindas de Lamarck) que acabou refutando com suas descobertas.

Fazer as perguntas certas significa coletar e armazenar os dados certos, ou seja, já ter algumas hipóteses do que pode ser a causa ou o que pode influenciar. Se a causa para quebras de máquinas é a temperatura ambiente, então temos que coletar estes dados e inseri-los na base de dados para depois poder utilizar as técnicas de análise com ajuda de software. Se esta for a causa e tais dados não estiverem na base, ou não descobriremos nunca a causa ou então estaremos calcados em descobertas enganosas.
Detalhes podem fazer a diferença. O ser humano tem a tendência de analisar o que é comum, mais frequente, o que aparece mais. É assim com a moda. Ninguém dá atenção para um tipo de acessório que só uma pessoa usa. Se vários estiverem usando o mesmo estilo, isto chama a atenção das pessoas comuns. Entretanto, num processo de descoberta ou investigação, os pequenos sinais podem ser muito úteis. Pergunte a um investigador policial. Então, num primeiro momento nada deve ser descartado. Todos os dados possíveis devem ser coletados e analisados. Todos os caminhos devem ser considerados. E várias hipóteses iniciais devem ser construídas.
Descobrir as hipóteses iniciais é um processo de tentativa e erro. Podemos acelerar com analogias e benchmarking. Mas talvez seja necessário fazer o processo de descoberta, analisar padrões ou causas possíveis, gerar hipóteses, testá-las com casos reais e aí refazer tudo de novo.


Visão Holística


Significa a "Visão do Todo", ver todos os elementos e suas relações. Isto ajuda a entender como o todo (problema) está composto e pode ajudar a direcionar o foco ou mesmo ver detalhes pouco percebidos.
Procure observar as interações, não só estabelecendo as conexões entre os elementos mas entendendo que tipo de conexão existe. X pode estar conectado a Y por ser sua causa, mas pode estar conectado a Z por que são ideias contrárias e pode estar conectado a W por outra razão diferente. Não estabeleça regras de tipos de conexões, não fique preso a paradigmas, tenha mente aberta.
Os gregos só conseguiram entrar em Troia porque estudaram o povo troiano. Se tivessem visto o todo (problema) somente como uma cidade-fortaleza com muros altos, poço de fogo, portão forte e guerreiros, estariam até hoje tentando entrar. A ideia do Cavalo de Troia veio porque eles entenderam que o problema incluía o povo troiano, e este detalhe fez a diferença. Eles descobriram que o povo troiano era supersticioso, muito religioso e acreditavam em presentes dos deuses. Daí veio o insight da solução.

Visão holística também tem a ver com Sinergia (o todo é maior que a mera soma das partes). Se ao analisar a molécula de água (H2O), observássemos os elementos hidrogênio e oxigênio em separado, não saberíamos que o estado natural da água é líquido. Quando os elementos de um todo interagem entre si, formam um sistema complexo que pode levar a resultados imprevisíveis.
Só listar os elementos não é suficiente; temos que entender as relações entre eles.


Transmissão de Conhecimento e Inteligência entre Gerações


Uma dúvida sobre a evolução das espécies é se os caracteres adquiridos passam de geração para geração. Lamarck acreditava que sim. Darwin no início também.

A Pangênese foi uma teoria proposta pelo filósofo grego Hipócrates, aproximadamente 410 anos a.C., e aceita até o século XIX para explicar a hereditariedade dos caracteres (inclusive dos adquiridos). Segundo esta teoria, todas as partes do organismo produziam partículas denominadas "gêmulas" que eram direcionadas para as células germinativas. Durante a reprodução sexuada, havia a mistura das partículas provenientes do macho e da fêmea produzindo um novo organismo com características de ambos os progenitores.
De acordo com a pangênese, a modificação do organismo durante a vida provocava alterações nas gêmulas e, consequentemente, poderiam ser transmitidas para as gerações seguintes. Por exemplo: o aumento de um músculo através do uso repetido poderia passar para os filhos da pessoa.

Gregor Mendel comprovou que caracteres adquiridos não passam (não há trocas das células somáticas para células germinativas). O que vale é a transmissão por genes + seleção natural (com mecanismos como mutação, combinação, etc.)

Há uma reportagem da revista Superinteressante sobre passar inteligência de pai para filho. Ver em http://super.abril.com.br/ciencia/tal-pai-tal-filho-443509.shtml.

Mas até hoje há muita discussão sobre isto e alguns pesquisadores já apontaram a possibilidade de parte da memória poder passar por gerações (aquela estranha sensação de déjà vu). Outra reportagem da mesma revista discute esta sensação: "A tese é que essas mentes acessam as lembranças na mesma fração de segundo em que elas são gravadas. E isso causa uma ilusão perene: o presente fica parecendo uma memória. É como se você vivesse o tempo todo no seu passado."


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terça-feira, 5 de maio de 2015

livro sobre Planejamento de TI e Sistemas de Informação





O objetivo deste livro é apresentar metodologias para planejamento de TI e sistemas de informação. A introdução discute a importância de que este planejamento seja feito alinhado aos objetivos do negócio ou da organização e discute também a gestão de portfólio de TI. Depois são apresentadas diversas metodologias adaptadas para planejamento de TI. A parte principal do livro é a apresentação de uma metodologia unificada, única e original, incorporando o que há de melhor nas metodologias existentes. Um exemplo completo de aplicação da metodologia é apresentado para um supermercado. São também apresentadas partes da aplicação da metodologia unificada para um Hospital Público e para uma empresa de serviços. Outra parte importante do livro é discutir o estudo de viabilidade, dividindo-o em 5 partes: viabilidades técnica, financeira, econômica, operacional e política. Na discussão sobre viabilidade econômica, o livro apresenta como calcular ROI (retorno do investimento) em projetos, além de discutir como quantificar benefícios. Alguns exemplos e exercícios para cálculo de ROI são apresentados. Há 2 anexos: um que discute como é feito o planejamento geral de uma organização e um questionário para auxiliar na coleta de dados para conhecimento da organização onde será feito o planejamento de TI.

Disponível para aquisição em 


Sumário