segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Se o ser humano é egoísta por natureza, por que compartilhamos informações ?

Se a teoria de Richard Dawkins (“O Gene Egoísta”) estiver certa, somos todos descendentes e portadores de genes egoístas. A teoria consiste em que os seres egoístas têm mais chances de sobreviver e assim passar seus genes para seus descendentes. Dawkins argumenta e defende sua teoria até mesmo com exemplos aparentes de altruísmo (quando alguém dá sua vida ou a põe em risco por causa de outros). Uma gazela que salta na frente de um predador não está querendo avisar seus semelhantes muito menos provocando o predador. Sua intenção é mostrar ao predador que ela sabe saltar alto e pode fugir facilmente, sugerindo que o predador procure outra vítima.

Dawkins também fala do altruísmo recíproco, quando por exemplo um macaco coça outro esperando mais tarde ser coçado por este mesmo “colega”. Até mesmo nestes casos, o egoísmo está presente: o que pede para ser coçado precisa disto para sobreviver (retirada de carrapatos, por exemplo). A teoria de Dawkins é que existem genes que definem nossos comportamentos, e alguns destes estão associados ao egoísmo, como uma busca por sobrevivência.

Isto pode explicar alguns comportamentos individuais em organizações no tocante a disseminação de informações e conhecimento.

Há interesses egoístas que não afetam o grupo todo. Por exemplo, pessoas escrevem textos ou fazem vídeos por puro prazer ou para descarga de energia e tensões. Os estudos neurológicos de Luke Chang, Alec Smith, Martin Dufwenberg e Alan Sanfey concluem que as pessoas colaboram para não se sentirem mal (aversão à culpa). Algo como "estar de bem consigo mesmo". Eles acreditam que a cooperação humana seja motivada por sentimentos morais. Mas a moral vem do grupo e aí retornamos ao altruísmo recíproco. “A sociedade civilizada é baseada na cooperação e na confiança”, dizem.

Mas há razões individuais que focam o grupo. Por exemplo, uma pessoa compartilhar conhecimento para valorizar uma comunidade, para que isto retorne de alguma maneira mais tarde para ela (recompensa tardia).

Ainda em relação ao grupo, pode-se buscar valorização individual dentro do grupo (altruísmo interesseiro). Então uma das razões e motivação para compartilhar informações pode estar no interesse egoísta de “querer aparecer” ou na busca pela fama. Isto pode ocorrer porque o indivíduo quer ser notado ou se diferenciar dos demais do grupo. É exatamente o comportamento inverso da gazela. A pessoa compartilha para aparentar ser melhor que os colegas, e então “cair nas graças” do chefe, para manter sua empregabilidade.

Um comportamento semelhante (e egoísta) é motivado para receber reconhecimento entre os colegas (melhorar sua reputação e garantir benefícios futuros). Aí os olhos que se buscam não são o do chefe, mas dos pares. Isto pode ajudar no momento de promoções por votação, ou mesmo quando avaliações são feitas pelos colegas.

Outro exemplo de motivação egoísta é compartilhar informações para receber informações de volta. Isto nos faz retomar o caso do altruísmo recíproco: o indivíduo faz porque acredita que os demais colegas também irão retribuir. Este é o princípio que alimenta o chamado Crowdsourcing. Em muitos casos, um indivíduo sozinho não consegue resolver problemas. Então o grupo, pela sabedoria das massas ou inteligência coletiva, pode gerar melhores soluções. E seria um interesse egoísta se a solução resolve um problema de quem iniciou o processo.

O altruísmo recíproco na colaboração entre pessoas pode ter efeitos negativos, quando a retribuição falha, não ocorrendo ou acontecendo em quantidade inferior à expectativa. Isto gera um desequilíbrio econômico tal que os indivíduos perderão o interesse em compartilhar. E novamente, é uma motivação egoísta (esperar retorno).

Por outro lado, as recompensas por compartilhar podem vir da organização e não dos colegas. Muitas empresas estão usando gameficação para avaliar pessoas. A ideia é uma analogia com os jogos eletrônicos, onde jogadores devem passar por fases, ganhando pontos ou vidas, ou até mesmo perdendo vidas. A cada boa ação do funcionário, ele é recompensando por uma boa avaliação (por exemplo, numérica). Uma variação disto é dar prêmios (por exemplo, bônus em dinheiro ou viagens) para aqueles que se destacarem como campeões na disseminação de conhecimentos ou ajuda a colegas.

Segundo Dawkins, alguns seres agem altruisticamente somente para serem aceitos no grupo, ou para não serem excluídos. Por exemplo, os macacos que não coçam outros são até mesmo hostilizados e recebem agressões. Então, o compartilhamento de informações por pessoas também pode ser motivado por causas semelhantes, para o indivíduo ser aceito no grupo ou para não ser excluído. E isto também é uma motivação egoísta.

Dawkins relata o caso de aves que dão gritos específicos para avisar o bando que há predador por perto. Apesar de aparentemente ser um ato altruísta, pois a ave coloca sua vida em risco, Dawkins diz que as aves fazem isto para que todo o bando fuja junto. Uma ave voando sozinha é mais fácil de ser pega, pois fica exposta. Esta é a vantagem de estar na multidão. Isto de certo modo, é uma forma de manipulação de "colegas". Na disseminação de informações, também pode ocorrer o mesmo comportamento. Pessoas compartilhando e influenciando outros para também compartilharem, mas com o intuito egoísta de "não ficar sozinho" ou para engrossar o grupo de descontentes em luta por uma causa. Este é um caso comum quando se tem um apelo ideológico: compartilhar para engajar ou recrutar mais pessoas, para fomentar ou espalhar ideologias e crenças.

Este comportamento é diferente do que ocorre com as renas ao fugirem dos lobos. Quando uma rena avista um lobo, ela sai correndo sem avisar o bando (comportamento egoísta). As que estão próximas da que correu primeiro, também correm, sem procurar saber o motivo. E assim por diante com as demais renas. Como não há uma organização nesta corrida desesperada, e cada uma corre para um lado e com um padrão diferente, o lobo não sabe a quem seguir e fica confuso, acabando por não capturar nenhuma rena. Então o ato egoísta de cada rena acaba por beneficiar o grupo todo. No caso de disseminação de informações, seria o caso de alguém compartilhar por interesse egoísta (por exemplo, descarga de energia)

Há também um outro comportamento egoísta que envolve o grupo. Acontece quando alguém compartilha para testar ideias ou sondar o que os outros estão pensando (coletar feedback). Isto permitira descobrir quem é quem no grupo, quais os papéis, quem são os influenciadores, quem está em cima do muro, etc.

Segundo o biólogo Richard Alexander, os seres humanos cooperam para competir. Ele e o psicólogo Nicholas Humphrey compartilham a teoria de que o cérebro humano se desenvolveu rapidamente pela necessidade de nos relacionar, para sermos mais fortes. Entender as relações internas no grupo foram vitais para melhor comunicar ideias, compreender os outros e organizar o grupo para traçar estratégias contra rivais.

Por outro lado, informação é poder. Se estamos compartilhando informações, estamos também cedendo parte de nosso poder aos outros. Estamos cedendo parte de nossos recursos ou mesmo tesouros. Talvez algo que nos custou muito para conseguirmos. E por que simplesmente dar aos outros, sem receber retorno ? Isto se constitui num dos maiores desafios para as empresas. Todas sofrem com problemas de rotatividade em equipes, com altos custos e demanda de tempo para treinar novos colaboradores, com a falta de registro de como foi feito "o caminho das pedras".


Pessoas possuem informações e conhecimento, soluções para problemas ou partes das soluções. Como motivá-las a compartilhar ? Uma alternativa seria procurar uma razão egoísta em cada um, incentivando seus interesses particulares. Isto pode incluir um dos fatores descritos acima. Por outro lado, não devemos condenar quem não compartilha. Ele ou ela pode simplesmente estar esperando o momento mais propício. Ou pode ser questão de personalidade (timidez, medo). Ou pode haver outras barreiras como ... Mas isto é assunto para outras postagem.  

Um comentário:

Roger disse...

Então eu te pergunto, qual seria o teu motivo egoísta para compartilhar tais informações tão interessantes?

Ps. Ótimos posts, parabéns!