sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Como as pessoas tomam decisões


Não quero ser ambicioso com este artigo. Ele não expõe todos os fatores envolvidos quando pessoas tomam decisões, muito menos disseca o processo mental, neurológico, cognitivo ou psicológico  que acontece antes ou durante este momento. Apenas discute alguns pontos que, pela minha experiência, estão envolvidos neste complexo processo humano. E entender um pouco mais sobre o processo de tomada de decisão poderá nos ajudar a tomar melhores decisões.

Gigerenzer e Gaissmaier (2011) perguntam como as decisões são tomadas e indicam apenas 3 caminhos possíveis: a lógica, o uso de estatísticas (olhar para passado) e o uso de heurísticas. Eu acrescentaria ainda, primeiro, o empirismo, ou seja, pelas experiências passadas, pela imitação do passado (nosso ou de outra pessoa). Seria o reuso de decisões, mas que muitas vezes não tem explicações lógicas. Neste pequeno acréscimo, já se faz necessário estudar o instinto humano, as intuições, a força do hábito e do treinamento, assuntos que serão discutidos neste artigo. As heurísticas não estão sozinhas. Se assemelham e talvez até sejam criadas a partir de tais fatores. Mas eles são muito específicos e merecem uma atenção mais detalhada.

Neste caminho, também não podemos deixar de falar das emoções e sentimentos e como eles influenciam a tomada de decisão. E este assunto nos leva até a discussão sobre fatos X opiniões. Será que toda decisão deve ser tomada com base em fatos ? Iremos mais adiante, falando de sinais fracos, que na maioria das vezes passam despercebidos, mas que podem fazer grandes estragos ou dar os melhores resultados.

Terminaremos apresentando a importância da criatividade para a tomada de decisões. Tentaremos explicar por que executivos pagam 10 mil dólares por cursos que duram um fim-de-semana e se resumem a colocá-los em situações imprevistas, por exemplo, no meio do mato ou descendo corredeiras (rafting).

Mas nosso artigo começa falando do modelo ideal de tomada de decisão e só depois partiremos para suas limitações, novas descobertas relacionadas e como melhorar nossas decisões.

Decisões racionais e raciocínio lógico

 Herbert Simon é talvez o maior nome no campo de estudo das decisões, tanto que recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 1978 por suas pesquisas nesta área. Ele nos apresenta um modelo clássico para o processo racional de tomada de decisão. O processo começa pela definição de um objetivo ou identificação de um problema, passa pelo levantamento de alternativas de solução, pelo levantamento de informações, até chegar à comparação das alternativas (os chamados modelos de decisão) e culmina com a escolha da melhor alternativa, segundo critérios bem definidos. Culmina, mas não termina aí. Porque o processo e seus resultados devem ser avaliados, como uma forma de realimentar o conhecimento que temos, validando-o ou complementando-o, e assim incrementar nossa capacidade de tomar decisões.

A premissa básica está no uso de informações. Sem informações não há decisões. Seria apenas um "chute" ou algo como uma bola de cristal. Há autores que dizem que uma organização pode ser vista como uma rede informação => decisão => ação. Ou seja, para desempenhar ações, é preciso antes tomar decisões; mas para tomar decisões, precisamos informações. Por exemplo, para alguém que quer montar uma  loja de roupas, antes de poder vender as roupas, será necessário tomar decisões, tais como para que público vender, que tipo de roupa comercializar, onde instalar a loja, de que fornecedores comprar, qual o preço de venda a praticar e etc. Mas para decidir cada etapa destas, precisaremos saber quais tipos de clientes existem, o que querem, onde estão, etc. E este processo é cíclico, ou seja, cada ação gera novas informações que realimentam o processo num novo ciclo. Assim, após fecharmos uma venda, teremos informações tais como que modelo foi vendido, qual o tamanho e cor, atributos de quem comprou (sexo, faixa etária, etc.) e como foi feito o pagamento. Esta retroalimentação ajuda a completar as informações e consequentemente melhorar as decisões.

A escolha da melhor alternativa pode ser feita através de modelos tais como tabelas ou árvores de decisão (que usam regras pré-definidas), modelo what-if (e-se) que avalia as consequências de cada alternativa, programação linear (que modela o problema como equações lineares num plano cartesiano), simulações, tabelas de multicritérios, entre os principais modelos de decisão.

Entretanto, toda decisão é incerta. Ou seja, não temos como saber com certeza, de antemão, se uma alternativa é melhor que as outras. Isto é apenas uma avaliação probabilística. E mesmo depois de tomada a decisão, mesmo que seus resultados tenham sido satisfatórios, ainda assim não temos como saber se era a melhor decisão, se não havia alguma alternativa melhor, a qual não nos veio à cabeça antes.

O objetivo de ter informações e usar raciocínio é poder diminuir a incerteza. Não é porque toda decisão é incerta que vamos deixar de avaliar alternativas, de coletar informações, de fazer comparações e tentar predizer consequências.

Para o levantamento de alternativas, podemos usar o raciocínio lógico, através de técnicas de indução, dedução ou mesmo abdução. Esta é uma capacidade que outros animais não possuem. Mas também será necessário utilizar criatividade. Não há regras que nos indiquem caminhos a seguir. Por exemplo, se um governante enfrenta greve de funcionários pedindo aumento, ele não tem como recorrer a um manual com sugestões. Ele pode usar analogias, como discutiremos adiante na parte de heurísticas, mas mesmo nestes casos é necessário utilizar a criatividade para adaptar as soluções. Esta é outra capacidade humana, que poucos animais possuem (talvez alguns chimpanzés em algumas situações, como explica Koestler).

Portanto, para uma decisão ser bem tomada, é preciso, segundo Simon, ter conhecimento sobre todas as alternativas disponíveis e ter todas as informações necessárias para comparar tais alternativas, incluindo suas consequências e probabilidades. E mais, isto tudo admitindo um mundo sem imprevistos, sem mudanças.

Ou seja, isto é impossível.

Racionalidade Limitada

 Não há como termos todas as informações disponíveis. Primeiro, porque nunca saberemos se esgotamos todas as alternativas possíveis. Segundo, também porque não temos como ter certeza se temos todas as consequências das possíveis decisões e se nossas avaliações probabilísticas estão corretas.

Simon (1972) defende a teoria da racionalidade limitada nas decisões. A premissa é que as pessoas procuram tomar decisões de forma racional, analisando dados, usando a lógica, etc., mas nem sempre isto é possível. O que acontece na prática é que as pessoas limitam o conjunto de informações e possibilidades. E na maioria das vezes, não vale a pena coletar todos os dados necessários e verificá-los.

Por exemplo, se uma pessoa quiser comprar um sapato, pensará em verificar na cidade qual a loja com o preço mais barato. Entretanto, se for avaliar o preço de cada loja, ao terminar o processo, terá levado tanto tempo que os primeiros preços consultados já poderão ter sido alterados e o custo total de deslocamentos e perda de tempo não valerá o desconto que conseguir. É impossível que o indivíduo conheça todas as alternativas para uma decisão e que possa avaliar todas as suas consequências. A tendência do ser humano é simplificar as escolhas. Isto quer dizer que não temos como saber se a decisão tomada foi a mais acertada antes de tomá-la; somente após saberemos se deu certo ou não. E mesmo tendo alcançado êxito, talvez não tenhamos certeza se foi a melhor alternativa.

Em geral então, as pessoas procuram diminuir a incerteza das decisões mas assumem certos riscos pela racionalidade limitada. Por exemplo, se alguém quiser traçar uma rota de fuga em caso de incêndio num prédio, talvez não consiga avaliar todas as alternativas possíveis (local de início do fogo, quantidade de pessoas, etc.). E no momento da situação de incêndio, o ser humano tem que simplificar ao máximo seu processo de decisão para acelerar as ações. Isto quer dizer que os planos iniciais podem ter sido esquecidos ou terão que ser simplificados. E assim, as atitudes planejadas mudam pela racionalidade limitada. E o ser humano então utiliza intuições e instintos para acelerar a decisão.

Tversky e Kahneman (este último, ganhado de prêmio Nobel) apresentam 3 princípios que limitam as decisões. O primeiro, o da disponibilidade, pressupõe uma certa capacidade para recuperarmos informações (discutido no próximo item). O segundo é o princípio da representatividade, pelo qual as pessoas fazem classificações e utilizam avaliações de similaridade, por exemplo para comparar situações atuais com anteriores, para reusar informações ou mesmo decisões já tomadas antes. O problema neste caso é que nem sempre as categorizações são feitas de forma correta ou completa. Por exemplo, pode-se contratar uma pessoa achando que ela será um bom funcionário porque seu currículo e atitudes são muito parecidos com os de um bom funcionário que já trabalhou na empresa. Entretanto, como dito antes, apenas alguns aspectos (por mais numerosos que sejam) foram utilizados neste processo. E além disto, há muita informação imprecisa e subjetiva.

O terceiro princípio é o da ancoragem e ajustamento, segundo o qual as pessoas utilizam pontos de referência e ajustam os caminhos a partir destes pontos. Isto pode envolver análises de dados históricos e modelos onde estes dados se encaixam. O problema é que o mundo, a vida, as pessoas, o mercado são muito complexos para seguirem tão perfeitamente modelos criados por humanos. Os pontos de referência podem ter sido mal definidos. Por exemplo, tomar como base as vendas do último ano, sem se dar conta que este ano de referência foi atípico. E há ainda erros na ajustagem. Se todo ano há um aumento de 10% nas vendas de um determinado produto, é o que se espera para o próximo ano. Mas as condições podem ser alteradas e o resultado pode vir a ser outro.
  

Avaliações probabilísticas e memória

 Tversky e Kahneman discutem o problema de avaliações probabilísticas erradas em decisões humanas. Eles apresentam diversos experimentos que comprovam que o ser humano avalia de forma errada muitas situações, usando modelos probabilísticos errados ou incompletos. O ser humano costuma fazer análises estatísticas “intuitivas”. Por exemplo, se perguntarmos a um motorista de ônibus público que faz diariamente o mesmo trajeto numa cidade quantas pessoas entram por dia no ônibus, é certo que ele terá uma resposta. Mas será que ela é confiável ? Como foi feito este cálculo ? Certamente não foi um “chute”. Mas também não deve ter sido baseada em planilhas que registram entrada de passageiros. Ele deve ter usado algum tipo de raciocínio probabilístico. Não há nada de errado nisto, se precisamos tomar uma decisão rápida. Entretanto, se precisarmos de uma informação precisa, outros meios devem ser utilizados (talvez uma análise estatística correta, com base em amostras e técnicas estatísticas).

Outra possibilidade é que o tal motorista tenha recuperado de sua memória algum dado registrado no passado. Talvez ele tenha ouvido alguém relatar a média de passageiros por dia. E talvez isto tenha ocorrido há muito tempo atrás. O mais provável é que ele tenha tomado como base apenas fatos recentes, pois há uma tendência do ser humano de recuperar somente dados mais recentes. Por isto, estamos dependentes de nossa memória.

Este é um dos princípios que Tversky e Kahneman discutem: a disponibilidade de informações. Algumas informações são recuperadas mais rapidamente. Lembrar o que comemos ontem ou detalhes daquela nossa viagem inesquecível é mais fácil que lembrar o que vimos num ônibus há 10 anos atrás. Técnicas de memorização, associações e talvez até registros eletrônicos podem nos ajudar nas decisões. Mas ainda assim, é o nosso cérebro que recupera o que considera mais importante e é ele que faz as conexões. O bom seria se pudéssemos recuperar tudo e fazer conexões na velocidade do computador. Assista ao filme "Sem limites" para entender o que isto significa.

Uma possível ajuda para a nossa memória está na adrenalina. Ela ajuda no registro de dados na memória. Há estudos que comprovam que o estresse libera adrenalina, a qual reforça nossa memória. Assim, há uma tendência para lembrar mais facilmente fatos que aconteceram em momentos de alta adrenalina. Por outro lado, há também fatores que fazem com que pessoas esqueçam certos fatos, principalmente quando isto traz um trauma psicológico muito grande.

Decisões Estruturadas x não-estruturadas

 Algumas decisões que tomamos podem ser descritas através de passos sistemáticos e de informações bem definidas. Por exemplo, se precisarmos decidir onde comprar um produto, sabemos que vamos procurar fornecedores, que vamos pedir cotações ou nós mesmos vamos avaliar seus preços, que vamos considerar outros atributos do fornecedor como credibilidade, prazo de entrega, localização, etc., e depois vamos escolher a melhor empresa segundo estes nossos critérios. Estas são chamadas decisões estruturadas.

Por outro lado, o ser humano também toma decisões sem saber explicar como. E não estou falando de "chute" ou adivinhação. Estas são as decisões não estruturadas. Por exemplo, ao ver um prato com arroz, feijão, bife e batatas fritas, certamente não há uma sistemática para devorar esta comida. Alguns vão começar pelo arroz (uma garfada) e depois passar para batatas fritas, outros irão fazer o inverso, e há alguém que talvez coma um tipo primeiro e deixe outro para o final. Mas o interessante é que as pessoas não conseguem explicar por que escolhem uma parte para começar, muito menos como decidem dar a 2a garfada. Isto acontece por motivos que vamos explicar mais adiante.

Em muitos casos, não há um critério bem definido, e pode até mesmo ser usada a sorte ou aleatoriedade, já que não irá fazer diferença no resultado. Entretanto, este tipo de decisão não significa menosprezo pelo resultado ou indiferença ou mesmo pressa. Quem investe em ações na bolsa possui alguma sistemática para conseguir informações e avaliar alternativas, mas a decisão final normalmente não é muito clara (é subjetiva) e não pode ser explicada. A contratação de um funcionário muitas vezes também cai neste tipo. Há quem tome uma decisão bastante estruturada, avaliando os candidatos por dados concretos, numéricos e usando tabelas de critérios. Mas muitos fazem após um "olho no olho", onde é possível usar intuições e percepções que não estão descritas no currículo escrito do candidato.

Em alguns trabalhos, esta mesma classificação é chamada de decisões conscientes e não conscientes.

Intuições

 A intuição é um palpite, mas não uma adivinhação. Ela deve ser precedida por dados. A questão é que a intuição acontece numa decisão sem muita explicação de onde veio e que dados foram usados. É como saber algo sem saber explicar como (uma criança que sabe que, se largar um copo, ele irá cair, mas não tem como explicar por quê). Max Gunther (2013) acredita que usamos dados do inconsciente, que foram colhidos e armazenados antes, mas que não temos consciência de quando os estamos usando. É como reconhecer um amigo na rua ou a voz de alguém no telefone. Não tem explicação, mas a gente faz e na maioria das vezes não erra.

O ser humano possui uma certa capacidade para tomar decisões rápidas com pouca informação. Isto não significa que devemos tomar decisões por pressa. A intuição não deve ser confundida com caminho mais fácil (preguiça). Gunther recomenda não confiar na primeira impressão, e sugere que coletemos muitos dados. Kahneman também concorda: é um grande risco tomar decisões usando a área preguiçosa e irracional do cérebro.

Daniel Kahneman (2012), ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2002, diz que temos dois sistemas de tomada de decisão: um rápido e outro devagar. O sistema rápido é utilizado por exemplo para reconhecer rostos. Até bebês o usam. E a gente não precisa raciocinar, é automático, sem esforço. Utiliza associações e reconhecimento de padrões, sendo difícil de controlar ou modificar. Já o sistema devagar é usado para, por exemplo calcular quantas horas tem em 4 dias. Ele é serial, controlável, flexível, governado por regras e exige muito esforço.

Ambos os sistemas são importantes. O segundo sistema é o que acreditamos ser mais comum e mais correto. Seria como um processo racional de decisão. Entretanto, nossas vidas estão cheias de exemplos de decisões certas que foram tomadas pelo sistema rápido.

Malcolm Gladwell, no livro Blink (2005), fala de experimentos de psicólogos analisando vídeos de casais conversando e tentando prever se o casal iria continuar junto ou não depois de 15 anos. Ao analisar 1 hora de vídeo, eles conseguiram uma acurácia de 95%, enquanto que analisando apenas 15 minutos de vídeos, atingiram 90% de precisão nas predições. Ou seja, não são necessários muitos dados nesta situação. Padrões podem ser identificados em resumos. Gladwell também comenta sobre técnicas utilizadas por americanos para reconhecer operadores alemães de código Morse. Como saber distinguir operados numa tarefa tão rápida como transmitir código Morse ? É algo que não pode ser explicado conscientemente.

Uchida, Kepecs e Mainen (2006) concluem que as pessoas vão acumulando dados, a partir de experiências e sentidos, os quais vão sendo agregados até o momento em que uma decisão é tomada. Mas isto acontece em frações de segundo.

Wilson (2004) discute o inconsciente adaptativo, um sistema de percepção não consciente, que utiliza funções de menor ordem (percepção, compreensão da linguagem), ao contrário de funções de alta ordem, envolvendo raciocínio. Segundo Wilson, nossos sentidos recebem 11 milhões de pedaços de informação num dado momento, nossos olhos recebem e enviam para cérebro 10 milhões de sinais a cada segundo, mas só conseguimos processar 40 partes de informação por segundo, de forma consciente. Por exemplo, se você pedir para um pianista explicar que sequência de teclas ele usa numa música que saiba tocar sem partitura (de memória ou de cabeça), dificilmente ele conseguirá explicar, ou pelo menos, levará um bom tempo tentando relembrar. Mas no momento de tocar a música, a sequência vem sem ele precisar pensar sobre isto.

Emoções e sentimentos

 Emoções, segundo Damasio (2005), são reações que acontecem no nosso corpo em razão da influência do meio em que estamos, do que estamos recebendo por nossos 5 sentidos. Já os sentimentos são o que o nosso cérebro pensa a respeito destas percepções do meio.

Emoção é uma experiência fisiológica, que nos dá informações sobre o mundo; são reações físicas do nosso corpo em relação ao que percebemos do mundo exterior (estímulos). Reações químicas e hormonais acontecem para nos proteger ou incentivar
(prazer). Automaticamente e de forma não consciente. Emoções são marcadores. Ajudam a lembrar coisas boas e ruins. Servem como alertas ou incentivos, através de dor ou prazer. Por exemplo, o coração bater mais forte, a boca ficar seca, a pele pálida, e os músculos se contraírem num momento de pânico.

Sentimento (feeling) é um ato consciente das emoções, quando percebemos as emoções. Quando o cérebro cognitivo sente as mudanças no corpo, então surge o sentimento. É um ato automático em reflexo às emoções. Por exemplo, depois das reações descritas acima, percebemos que estamos tendo medo.

O lado direito do cérebro sente enquanto que o lado esquerdo pensa. Nossa consciência pode ignorar os sinais enviados pelo corpo. Não podemos eliminar emoções. Mas podemos controlar sentimentos.

Damasio descobriu que pacientes com danos corticais pré-frontais não podem mais ter emoções. E também descobriu que estes pacientes não conseguiam tomar decisões que envolviam escolhas emocionais, apesar de conseguirem diferenciar benefícios e malefícios de cada alternativa. Entretanto, o momento final, da escolha, este momento era subtraído. Damasio critica a teoria de Descartes, dizendo que não se pode separar corpo e mente, nem para decidir.

Nirenberg (1981) nos diz que as emoções são naturais, não podem ser controladas. A lógica não dissipa emoções. Portanto, não há como dizer para uma pessoa "não tenha medo", "não sinta raiva ou pena". As emoções surgem sem consentimento. Mas podemos controlar o que fazemos em relação a elas, nossas atitudes após o reconhecimento do sentimento envolvido com as emoções. Podemos saber separar as emoções que estamos tendo e os critérios objetivos que vamos utilizar numa escolha.

É claro que algumas decisões exigem emoções. Por exemplo, escolher um quadro de arte para expor na parede de nossa sala, ou uma música para nossa entrada num evento ou a pessoa com quem vamos casar. Até mesmo talvez a escolha de um fornecedor ou funcionário possa ser influenciada por emoções, permitindo-nos escolher alguém ou alguma empresa com quem estejamos mais afinados, principalmente pelas nossas crenças. Mas há decisões que exigem o mínimo de interferência das nossas emoções, como no caso de escolher uma máquina mais adequada para automatizar um processo.

Instintos

 Os instintos são reflexos de nossos genes e alguns estão enraizados em nós desde o tempo das savanas (antes das cavernas), sendo transmitidos de geração em geração por milhares de anos. Winston (2006) discute diversos tipos de instintos, desde os envolvidos com acasalamento e reprodução, até o medo, a fome, a agressividade e raiva, a necessidade de sobrevivência e o egoísmo e cooperação.

Instintos envolvem reações químicas que avisam o cérebro sobre acontecimentos. E o cérebro repassa a informação para outros órgãos. Isto é fruto da seleção natural, por milhões de anos aprimorando os seres para adaptação ao meio em que vivem. Por exemplo, uma criança (ou qualquer outro animal) ter medo de cobra e não ter medo de uma flor, sem ter visto antes uma cobra ou uma flor; isto acontece sem que haja experiências anteriores. É instinto e está registrado em nossos genes.

Conforme Dawkins (2007) e Winston (2006) muito do nosso comportamento é moldado por genes. A escolha de um parceiro sexual é influenciada pelos instintos. Recebemos dados do parceiro (cheiro, timbre de voz, aparência) e isto desencadeia reações internas no corpo, as quais nos predispõem para algumas escolhas. Nenês choram quando estão com fome, sem precisar se dar conta que estão com fome. Os instintos nos ajudam a tomar decisões rápidas, quando não há tempo para pensar. O medo para fugir, o instinto de pegar algo que está caindo, a fuga do fogo, o agradecimento com um sorriso.

Entretanto, os genes não dizem o que devemos fazer numa determinada situação, apenas nos dão predisposição para aprendermos e adaptarmo-nos a novas situações, influenciando assim nossas decisões. Mas sempre há escolhas que podem ser feitas com base em crenças e princípios, ou mesmo através da lógica, contrariando os instintos.

Apesar da grande influência dos nossos genes, também aprendemos com a cultura e experiência, e somos influenciados pelo meio em que crescemos e vivemos. O sorriso pode sair de forma espontânea, mas também podemos treiná-lo para sermos cordiais e certamente isto é aprendido na família.

Segundo Dawkins, nossos genes poderão nos instruir a ser egoístas, mas não estamos necessariamente compelidos a obedecê-los por toda nossa vida. Somos produtos dos genes e do meio em que vivemos. Uma combinação de ambos. Ora nos comportamos como homens e mulheres das cavernas, ora como “pessoas civilizadas”.

A Cultura e a Sociedade - o Contrato Social

 Muitas das nossas decisões são condicionadas por nossa cultura, ética e pelas leis que nos governam. Os instintos nos influenciam, mas há o livre arbítrio, o poder de decisão do raciocínio sobre intuições, emoções e instintos (quando há tempo para pensar).

Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau escreveram sobre o Contrato Social (ou contratualismo), explicando por que as pessoas abrem mão de certos direitos  para um governo ou autoridade, a fim de obter as vantagens da ordem social. O  contrato social é um acordo entre os membros da sociedade sobre um conjunto de regras. O ponto de partida é um "estado de natureza", onde não há ordem nem regras, apenas instintos e a consciência de cada um. Mas o "estado de natureza" gera conflitos e é percebido como malefício para cada indivíduo. Então, o pacto social pode ser definido como cada um colocando sua pessoa e sua potência sob a direção suprema da vontade geral, organizada e controlada por um governo geral. A vantagem está em ter alguém controlando os direitos e deveres dos cidadãos e reprimindo comportamentos errantes, o que não poderia ser feito por cada indivíduo nem por auto-organização (ou pelo anarquismo).

Na França na época da Queda da Bastilha, a teoria difundida dizia respeito à liberdade, igualdade e fraternidade. Ou seja, todos têm direito a fazer o que querem (liberdade), mas devem lembrar que os outros também possuem o mesmo direito (igualdade). E quando houver conflito, a fraternidade deve prevalecer. Entretanto, como já é sabido, a mediação de conflitos nem sempre funciona de forma auto-organizada. É preciso estabelecer leis, regras e princípios éticos e também definir um órgão que supervisione a prática do que foi estabelecido. Este contrato social é então definido para um grupo e por sua maioria, segundo os princípios da democracia.

E estes princípios éticos e crenças começam a ser formados já no berço e irão orientar as decisões das pessoas por toda a vida. Segundo Winston, os primeiros anos moldam a rede neural da criança; seu desenvolvimento depende da cultura e das pessoas à sua volta. Winston conta o caso de crianças que cresceram isoladas ou no mato, e que não conseguiram se adaptar ao meio (por exemplo, o caso das meninas-lobo de Midnapore, Amala e Kamala). Esta cultura que vem do berço é o que chamamos educação da família.

Afora a família, o grupo social onde o indivíduo se insere também influencia suas decisões. Este grupo pode ser o colégio, meio profissional, empresa onde trabalha ou simplesmente o círculo de amigos. Bowles (2000) afirma que as pessoas sofrem pressões para se comportarem uniformemente, ou seja, a sociedade é contra qualquer tipo de contrariedade ou comportamento diverso. Indivíduos que não seguem as regras são excluídos.

Por outro lado, há culturas estabelecidas que não precisam de regras ou documentos formais para serem seguidas. Evoluem com o tempo e ficam associadas a sociedades porque seus indivíduos as aceitam. E isto acaba por caracterizar e distinguir grupos sociais. Há certos tipos de conhecimentos que são do grupo, permitindo a distinção entre subgrupos e permitindo às pessoas se integrarem (mas também gerando exclusões e preconceitos). Marshall McLuhan e Manuel Castells escreveram muito sobre isto.

A estrutura das interações sociais, dentro de grupos ou entre grupos, afetam a direção da evolução cultural. McPherson, Smith-Lovin e Cook (2001) afirmam que as pessoas tendem a se relacionar com quem são mais similares, isto é, com quem compartilham os mesmos gostos, interesses ou características demográficas. Este é o princípio da homofilia. E o reverso também é verdadeiro: a similaridade fomenta conexões. As redes pessoais são homogêneas (por características sócio-demográficas ou comportamentais). Isto implica nas informações que as pessoas recebem e as atitudes que formam.

Cultura, segundo Cantor e Whitehead (2013), é o comportamento transmitido socialmente e compartilhado dentro de subgrupos de uma população. A cultura afeta a estrutura social e é afetada por esta. Primeiro, a cultura influencia o aprendizado social. Há uma tendência para os indivíduos convergirem para comportamentos similares mas com diferentes graus de especialização. E os especialistas se tornam elementos centrais nestas redes. Por outro lado, se não houver aprendizado social em grupos com diferentes graus de especialização, os generalistas se tornarão elementos centrais, o isolamento aumenta e a diversidade diminui. Um dos perigos envolvidos é conformismo, que é a tendência de indivíduos adotaram o comportamento mais frequente (pouca diversidade), isolando os mais diferentes.

Hábitos

 A padronização facilita a nossa vida. Estabelecemos padrões para acordar, tomar banho, tomar café, escovar os dentes, pegar pasta de trabalho e chave e sair (chamamos rotina). Agiliza porque não precisamos parar para pensar no que vamos fazer em seguida. Permite pensar em outras coisas enquanto estamos fazendo as básicas.

Em outras situações, quando não há tempo para raciocinar, o hábito nos ajudará a tomar as decisões certas. Por exemplo, o jogador que assume a função de líbero num time de vôlei, quando ele faz uma defesa, ele não pensa conscientemente. A reação é em milésimos de segundos. Mas seu cérebro precisa tomar decisões quanto a posicionamento do corpo (pernas, braços, mãos, etc.), para rebater a bola para frente, em direção ao meio da quadra, sem passar a rede e sem ficar muito perpendicular a  ele mesmo. Para tanto, ele vai dispor braços, mãos e restante do corpo, mas a decisão não é consciente. As decisões rápidas (e acertadas) neste caso vêm devido a treino (a força do hábito). É como digitar um texto num computador sem olhar para o teclado. Se perguntarmos a uma pessoa que digite textos rapidamente onde fica uma determinada letra, ele terá que parar para pensar. Mas se pedirmos para ele digitar uma palavra, esta sairá rapidamente.

Kahneman fala da importância de praticar o hábito. Ele afirma que os grandes jogadores de xadrez não veem o mesmo tabuleiro como um novato. Eles conseguem visualizar jogadas possíveis pela força do hábito. O treino gera uma habilidade para acessar mais rapidamente certas informações no cérebro e organizá-las melhor.

Gladwell, no seu livro sobre Outliers (2011), chega a um número mágico de 10 mil horas de treino, que distingue os grandes campeões dos demais. Ele vê isto em grandes músicos e jogadores. Se uma pessoa treinar 8 horas por dia, todos os dias, sem folgas, precisará de 3,4 anos para chegar a este número. É por isto que podemos notar que grandes campeões de esportes ou músicos virtuoses começaram com pouca idade.

Duhigg (2012) diz que podemos instalar hábitos em nossos cérebros. Eles ficam armazenados em áreas específicas do cérebro e podem ser recuperados de forma inconsciente. Começa com um estímulo que manda o cérebro entrar em modo automático, e indica qual hábito deve ser usado. As recompensas (dor, prazer, etc.) ajudam o cérebro a saber se vale a pena memorizar este hábito para o futuro ou não. A sugestão é definir um plano para uma rotina que traga a mesma recompensa. Para o líbero do vôlei, seria treinar exaustivamente defesas e recompensar com felicidade ou tristeza cada resultado. Recompensas diferentes ajudam o cérebro a diferenciar ações boas de ruins.

Heurísticas

 Imagine o problema de ter que ensinar uma criança ou um robô a sair de um labirinto. Não há como criar soluções procedurais ou algorítmicas pois não se sabe como será o labirinto. Ou seja, não há uma sequência de ações ou decisões que podem ser tomadas para garantir o resultado. Mas o ser humano pode definir um plano tipo tentativa-e-erro usando decisões aleatórias. O problema é que deste jeito a pessoa ou robô poderá estar repetindo caminhos e aumentando o tempo para encontrar a saída ou mesmo eternizando um plano que não chega à solução.

Um plano possível seria utilizar 3 regras simples baseadas em condições que a pessoa ou robô irá encontrar pela frente. São elas:
1.      Se só houver um caminho a seguir, siga em frente ou pelo caminho que houver,;
2.      Se encontrar uma decisão (2 ou mais caminhos alternativos), siga pelo caminho mais à esquerda ainda não visitado;
3.      Se encontrar uma parede ou situação em que não tem para onde ir; volte à decisão anterior.

Tal tipo de solução não garante que o robô chegará até a saída, pois poderá haver loopings ou mesmo não haver uma saída. Estas regras, que orientam decisões mesmo sem garantir resultados, são as chamadas heurísticas (ou regras heurísticas).

Em muita decisões, não há informações suficientes para uma boa escolha. Por exemplo, ao chegarmos a uma encruzilhada, no caminho em direção a um destino, e se não tivermos um mapa, vamos usar heurísticas para escolher o caminho a seguir. Talvez alguém olhe para o céu, e mesmo sem saber orientar-se por ele, tenha um lampejo de informação, lembrando de uma situação semelhante em que ficou perdido. Outros olharão para o chão, lembrando situações que viram num filme (nunca experimentaram a mesma situação mas reusarão soluções que foram úteis para outras pessoas).

Algumas heurísticas estão enraizadas no ser humano como hábito ou instinto. Por exemplo, segurar coisas que caem, fugir do fogo ou de animais que rosnam. Mas as heurísticas também são usadas para acelerar a solução de problemas. Conforme, Gigerenzer e Gaissmaier (2011), uma heurística é uma estratégia que ignora parte da informação com o objetivo de fazer decisões mais rápidas do que métodos complexos. Em casos onde não há tempo para pensar, as heurísticas podem funcionar.

Por outro lado, como as heurísticas são usadas sem consciência, podem gerar resultados catastróficos, quando seria melhor raciocinar sobre alternativas. Gladwell no livro Blink (2011) descreve o caso de um bombeiro que sobreviveu a um incêndio na floresta parando para pensar numa solução, enquanto que seus companheiros não tiveram a mesma sorte porque seguiram seus instintos (ou heurísticas).

Lenat (1982) diz que as heurísticas podem ser construídas por especialização ou por generalização. Por exemplo, se uma decisão foi útil numa caminhada por uma floresta, é possível que também seja útil em qualquer tipo de caminhada (generalização) ou em caminhadas menores (especialização). A força das heurísticas está na analogia que proporcionam. Se uma heurística H foi útil numa situação S, então heurísticas similares a H serão úteis em situações similares a S (analogia). Entretanto, se o ambiente muda rapidamente, as heurísticas possuem pouco tempo de vida.

Em resumo, as heurísticas funcionam bem para ajudar o raciocínio, eliminando alternativas quando há muitas e não há tempo ou recursos suficientes para avaliar todas.

Estatísticas

 O maior benefício da estatística é espantar o "achômetro". Com a estatística, as pessoas podem basear suas decisões com base em fatos e dados. E provavelmente, as decisões levarão a melhores resultados. Por exemplo, os ouvidores de uma concessionária de rodovias acreditava, por intuição, que o trecho mais problemático era um. Após uma análise estatística das ocorrências, eles descobriram que não; o trecho mais problemático era outro. Isto quer dizer que talvez eles estivessem investindo em estratégias completamente erradas.

A campanha de Obama para presidência dos EUA em 2012 foi baseada em dados estatísticos. Sua equipe contava com engenheiros de computação especialistas em Data Mining (Moraes, 2012). Coletaram dados das redes sociais, de listas públicas e de bancos de dados de empresas privadas. Aplicaram Data Mining, incluindo clustering para segmentação de pessoas, web mining para descobrir padrões em acessos ao site da campanha e análise de sentimentos em redes sociais. Com base nisto, definiram as estratégias da campanha e avaliavam também com Data Mining. As que davam mais certo, eram reusadas. Até mesmo para escolher a personalidade que iria participar dos jantares, o Data Mining foi decisivo, traçando perfil dos convidados e cruzando com perfis de famosos do cinema.

No Brasil, o técnico de vôlei Bernardinho e sua equipe têm conseguido grandes resultados para o time nacional de vôlei usando estatísticas. Eles monitoram tudo o que é feito por cada jogador do time do Brasil e também dos adversários. Registram todos os tipos de jogadas, se resultaram em fracasso ou sucesso, como estava a posição dos jogadores, e com isto extraem relatórios de que jogadores estão melhor e quais estão com pior desempenho. Então, quando um brasileiro for "sacar", eles analisam em tempo real as estatísticas e verificam para que adversário deve ser direcionado o saque e de que forma (tipo de saque). E isto é feito para outras estratégias além do saque.

Lewis (2004), no livro Moneyball (que depois virou filme com Brad Pitt), conta a história de Billy Beane e do Oakland Athletics, time de baseball. A estratégia de Beane, com ajuda de conselhos de um estatístico, era selecionar jogadores baratos mas com bons índices estatísticos em alguns quesitos de avaliação. Desta forma, eles conseguiram criar um time barato com bom desempenho, enquanto os grandes times utilizavam olheiros especialistas (scouts) que utilizavam somente intuições para avaliar novos jogadores. Enquanto o Oakland Athletics conseguiu gastar 500 mil por vitória, outros times gastaram 750 mil e o Texas Rangers chegou a 3 milhões de dólares por vitória. Eles conseguiram provar que o sucesso no baseball se deve mais a como você gasta o dinheiro e não quanto você tem.

Entretanto, Nate Silver (2013) comenta que em alguns casos os olheiros do baseball tiveram melhores desempenhos que as estatísticas do sistema Pecota, contrariando a estratégia descrita em Moneyball. As estatísticas funcionaram para jogadores de divisões inferiores, mas não foram muito bem na primeira liga. E para jogadores dos níveis mais inferiores ainda deram resultados muito piores. Lewis (2004) acredita as pessoas (naquele caso, os olheiros) podem acumular mais informações subjetivas, que muitas vezes não estão armazenadas ou não podem ser coletadas por sistemas automatizados. Naquele caso, os olheiros podiam conhecer melhor o ambiente familiar dos jovens jogadores.

Nate Silver fala de dois tipos de tomadores de decisões: os porcos-espinhos e as raposas. Porcos-espinhos são pessoas que acreditam em grandes ideias e que certos princípios regem o mundo. Raposas, por outro lado, são pessoas que acreditam numa infinidade de pequenas ideias e em adotar uma série de abordagens diferentes para um problema. Tendem a ser mais tolerantes em relação às nuances, à incerteza, à complexidade e às opiniões discordantes. Se os porcos-espinhos são caçadores e estão sempre em busca de uma grande presa, as raposas são animais coletores. Raposas usam mais dados. Porcos-espinhos usam poucos índices (reduzir algo complexo a poucas variáveis). E como consequência, Silver acredita que raposas são muito melhores em fazer previsões do que porcos-espinhos.

Em outros casos, informações demais atrapalham a tomada de decisão. Nate Silver fala que "menos é mais" em alguns casos. No exemplo do baseball, alguns olheiros usavam informações pouco relevantes, tal como por exemplo a aparência do jogador. Mas como a interpretação dos resultados estatísticos é humano, muitos dados estatísticos também podem deturpar as análises. Silver comenta que muitas estatísticas do baseball eram baseadas em variáveis que não interferiam nos resultados, e assim as análises estavam gerando interpretações erradas.

Por isto, a equipe de Obama achou melhor mesclar dados e sentimentos das pessoas.

Sobrecarga de informações

 O poder de armazenamento e análise de dados pelas chamadas tecnologias da informação está gerando o fenômeno conhecido como Big Data. As consequências são o stress (querer estar sempre atualizado e recolhendo dados) e a sobrecarga de informações ou information overload (estar perdido com tanta informação e não conseguir encontrar o que se quer). A sobrecarga faz muita coisa relevante parecer irrelevante e o contrário também. Como há falta de tempo e recursos para analisar todos os dados e alternativas, as pessoas filtram informações e alternativas. Mas muitas vezes, as heurísticas utilizadas não são as melhores.

Gladwell, no livro Blink, afirma que, quando estamos em situações de estresse, a nossa mente foca e reduz informações. Ele conta vários casos de policiais relatando situações de estresse, atirando contra ou abordando criminosos; o excitamento deixava as pessoas cegas. Veem somente um cenário principal e descartam o que está em volta, inclusive sons.

Este é o efeito da sobrecarga de informações. Temos dificuldades para distinguir o que é mais importante. Talvez, nestas situações o hábito, as intuições e instintos funcionem melhor.

Qualitativo para Quantitativo

 Usamos números e funções matemáticas para facilitar o entendimento de situações complexas, para facilitar o raciocínio probabilístico e a tomada de decisões. Softwares de biometria reduzem características humanas a números ou funções matemáticas (modelo vetorial, representando objetos através de pontos, retas e polígonos). Isto agiliza o processo de comparações para identificar pessoas. Ritmo de vendas de produtos são representados por funções matemáticas ao longo do tempo, para ajudar no controle de estoque e facilitar a decisão de quanto e quando comprar novamente. Estes modelos matemáticos também nos ajudam gerando alertas de comportamentos fora do comum. E também para entender o que é comum ou padrão.

Dados quantitativos ajudam a acomodar a incerteza e a imprecisão. Imagine-se tentando classificar clientes por idade. Pessoas até 30 anos serão consideradas jovens, com mais de 30 serão adultos, com mais de 60 farão parte da 3a idade. Mas uma pessoa com idade próxima dos limites acabará por sair de um grupo e entrar noutro apenas com a virada de dia. A lógica difusa (fuzzy) permite que pessoas possam ser classificadas em várias categorias com graus de pertinência diferente. Ou seja, uma pessoa de 20 anos é jovem com certeza, mas um de 29 anos ainda poderá ser considerado jovem mas com grau menor que o de 20.

Fatos X Opiniões

 Estamos acostumados a pensar que toda decisão deve ser baseada em fatos e raciocínio lógico. Entretanto, como já discutimos antes, pela racionalidade limitada, nem sempre é possível coletar e analisar todos os dados e alternativas necessários, ou mesmo verificar a veracidade de tudo o que ouvimos e lemos. Em muitos casos, utilizar uma informação não confirmada, pode ser o pulo do gato na frente dos demais concorrentes.

Por exemplo, a maioria dos investidores das bolsas de valores utilizam softwares que analisam dados históricos e fazem previsões através de técnicas de Data Mining (mineração de dados). Mas todos os investidores tomarem decisões da mesma forma (com os mesmos dados e técnicas), ninguém vai ganhar. Para  vender, é preciso que alguém compre e vice-versa. Então, para ganhar na Bolsa é preciso ter uma visão diferente dos outros, sobre algo que pode dar certo ou errado, enquanto os outros estão pensando o contrário.

Sinais Fracos

 A estratégia das raposas, segundo Nate Silver, é utilizar uma quantidade maior de dados, mas que aparentemente não possuem um grande diferencial. Existem informações que sozinhas não significam muito, mas quanto integradas podem ajudar a predizer eventos. Estes são os chamados sinais fracos (weak signals) segundo Ansoff (1980). Sinais fracos são aqueles pedaços de informação, ambíguos, vagos, incompletos, imprecisos e controversos. Não são claros; são quase mudos. Estão normalmente escondidos no ruído e não recebem muita atenção no processo de decisão.
Gradualmente se integram para formar um padrão de inteligência, que dão alertas de necessidades de mudanças. Tornam-se fortes quando combinados com outros sinais. "Uma andorinha sozinha não faz verão".

Sinais fracos podem gerar grandes influências nos resultados. A Teoria do Caos (Gleick, 1989) explica que pequenas alterações em algumas variáveis podem modificar completamente o resultado final. Daí é que surge o tal efeito borboleta (uma borboleta voando no Brasil pode gerar uma tempestade no Texas). Gladwell, no livro Ponto da Virada (2013) também comenta sobre pequenos eventos que desencadeiam grandes revoluções. Há muitos exemplos na moda e no marketing.

Pentland estuda o que ele chama de sinais honestos. São sinais que aparecem nos rostos das pessoas, impercebíveis no cotidiano pelo olhar humano, muito porque acontecem num tempo menor que um piscar de olhos. Quando assistimos vídeos em câmera lenta, tais sinais aparecem claramente. Pentland e sua equipe utilizam tecnologias para detectar estes sinais honestos. Os sinais podem ser demonstrações de empatia para facilitar e encorajar comunicação (ex.: acenos com cabeça) ou podem indicar estresse. E não aparecem somente no rosto, mas são demonstrados por todo o corpo humano. A linguagem dissimula emoções, mas o corpo não as consegue esconder. Já há até taxonomias para análise de expressões faciais (Ekman e Rosenberg, 1997; Kring e Sloan, 2007)

O ser humano intuitivamente consegue identificar tais sinais. É o que muitos dizem de uma conversa olho no olho para conhecer melhor uma pessoa. As decisões referentes a escolha ou avaliação de pessoas são feitas assim. Mas também servem para avaliar veracidade de argumentos e informações que os outros nos passam. Saber reconhecer tais sinais pode melhorar nossa tomada de decisão. Os estudos de Pentland concluíram que empregados que se valem de interações cara a cara acabam sendo 30% mais produtivos.

Criatividade

 Os hábitos e heurísticas são úteis em situações que se repetem. Mas quando estamos enfrentando uma situação nova, o que fazer ? Podemos usar analogias, reusando e adaptando soluções que já foram úteis no passado. Mas para um executivo ou designer, muitas vezes o melhor é tomar uma decisão nova, que nunca foi usada antes.

Muitas empresas estão obrigando seus executivos a fazerem cursos caríssimos para situações inusitadas. Eles são "jogados" no mato sem recurso algo e devem cumprir tarefas. Ou então são formados times e os cadarços de uma pessoa do time ficam atados aos de outra pessoa. E começa a competição. O que este tipo de treinamento está tentando oferecer aos executivos é uma nova forma de tomar decisões. Muitos executivos passam boa parte do seu dia e semana e mês e anos tomando as mesmas decisões, nas mesmas situações, com as mesmas alternativas. Não conseguem mais pensar em novos caminhos. Estão formatados num mesmo padrão. Colocá-los em situações novas, diferentes, nunca antes pensadas, podem ajudá-los a procurar novos caminhos, ver o mundo de forma diferente. Isto vai ajudá-los a identificar novas alternativas nas mesmas situações anteriores. Em mercados de inovação e alta competitividade entre empresas, é preciso ser diferente, é preciso pensar diferente.

Em uma competição, a criatividade permite sair do padrão para vencer. O novo gênio do xadrez mundial, o jovem norueguês Magnus Carlsen (o Mozart do Xadrez) não usa técnicas usuais. Ele faz jogadas inesperadas e isto desconcerta os adversários, que ficam sem saber que estratégia ele está usando. Um jogador que bate pênaltis no futebol, o levantador de um time de vôlei ou o lançador (pitcher) do baseball, eles precisam ser criativos para variar suas jogadas, para enganar o adversário ou para não demonstrarem um padrão previsível.

Outro treinamento interessante é fazer as pessoas utilizarem ambos os lados do cérebro. O lado esquerdo é lógico, matemático, sequencial, sistemático. Pensa no passado e no futuro. Controla a linguagem. O lado direito é criativo, sensitivo, paralelo. É responsável por receber os 5 sentidos, ao mesmo tempo. Está ligado ao presente. E pensa na forma de imagens. Antigamente se pensava que profissões que exigiam raciocínio lógico ou matemático deveriam desenvolver somente o lado esquerdo do cérebro. E pessoas de áreas criativas como artes e música deveriam se preocupar somente com o lado direito. Pois bem, estudos recentes indicam que, se fizermos isto, estaremos criando uma barreira entre os 2 lados. Na verdade, não é uma barreira física, mas sim diminuindo a comunicação entre os 2 lados e assim diminuindo nossas capacidades cerebrais. Desenvolver os 2 lados ajuda a criar novas conexões e assim podemos "aumentar" a área de pensamento. Desta forma, executivos estão fazendo como hobby música, dança, escultura, pintura, teatro. Já os artistas deveriam também estudar matemática e fazer exercícios lógicos.

Conclusão

 Melhores resultados para quem tem mais dados. Estatística é importante mas análises subjetivas também ajudam. Intuições e emoções podem nos ajudar a recuperar dados que conscientemente não conseguimos acessar. Para decisões rápidas, instintos e hábito. Lembrando também que as heurísticas encurtam caminhos, já que decisão são sempre tomadas com a racionalidade limitada. E os sinais fracos, aparentemente sem significado, quando juntos podem nos dizer coisas importantes. Então não devemos esperar sinais grandiosos, como trovões ou tempestades. Talvez uma brisa já anuncie alguma mudança futura.

Também é importante analisar o que é melhor em cada caso. Para escolher um parceiro para casar ou simplesmente uma companhia para um cinema, emoções e intuições funcionam melhor. Para escolher uma loja onde comprar, opiniões de pessoas podem ser mais úteis que dados estatísticos. Mas fatos certamente são mais considerados para fazer julgamentos. Para encontrar padrões em dados históricos, estatística. Para fazer previsões futuras, um pouco de tudo. Quando for prudente, seguir as normas do grupo. Mas não devemos nos deixar conduzir apenas por elas. E por fim, criatividade para gerar decisões melhores a cada vez e principalmente em situações novas e inesperadas.


Referências


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2 comentários:

Anônimo disse...

"You are deciding between a trip to Hawaii and
a trip to Rome. On Hawaii, you envision yourself swimming in the ocean, relaxing on the
beach, playing tennis, and drinking mai tais. Rome will find you sitting in cafés, visiting
museums and ancient ruins, and drinking an impressive amount of wine. Which vacation
should you choose? It is quite possible that your “experiencing self” would be much
happier on Hawaii, as indicated by an hourly tally of your emotional and sensory
pleasure, while your remembering self would give a much more positive account of
Rome one year hence. Which self would be right? Does the question even make sense?
Kahneman observes that while most of us think our “experiencing self” must be more
important, it has no voice in our decisions about what to do in life. After all, we can’t
choose from among experiences; we must choose from among remembered (or imagined)
experiences. And, according to Kahneman, we don’t tend to think about the future as a
set of experiences; we think of it as a set of “anticipated memories.” 7 The problem, with
regard to both doing science and living one’s life, is that the “remembering self” is the
only one who can think and speak about the past. It is, therefore, the only one who can
consciously make decisions in light of past experience."
Do livro "The moral landscape" (Sam Harris)

Stanley Loh disse...

O melhor livro sobre como as pessoas tomam decisões. Aborda todos os tipos de temas relacionados. Com 30% do livro, já havia 250 referências bibliográficas citadas.
Os autores praticamente compilaram TODOS os trabalhos relevantes que tratam do tema.

Só para citar alguns tópicos: evolucionismo X formas de decisão; empatia e ocitocina; altruísmo/cooperação X egoísmo/deserção; inveja; todos os jogos utilizados para análise de decisões (do ditador, do ultimato, do investidor, dilema do prisioneiro, tragédia dos comuns, etc).

Desejo e decisão: Como a evolução da mente influencia nas nossas escolhas.
José Carlos Junça de Morais, Jurandir Sell Macedo Jr, Régine Kolinsky.
Editora IEF, 2014, 307 páginas.

http://www.amazon.com.br/Desejo-decis%C3%A3o-evolu%C3%A7%C3%A3o-influencia-escolhas-ebook/dp/B00P9UQ5XM/ref=sr_1_1?ie=UTF8&qid=1436613978&sr=8-1&keywords=decis%C3%A3o+e+desejo